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Pedro Rolo Duarte

30
Out08

Reality Show

 

 

Contei aqui no blog  como cortei a relação contratual que mantinha há anos com a Zon (desde o tempo em que era TV Cabo). Na verdade, os senhores que comercializam os produtos da empresa calaram-se para todo o sempre, o que muito agradeço.

Mudei-me para a concorrência (avisando-a previamente do que sucederia caso começasse a receber telefonemas que começam com “Estou a falar com o sr. Pedro Duarte?”...), e num dia desta semana lá me bateram à porta. “É do Meo”, disse uma voz nasalada pelo intercomunicador. Abri.

Não esperava, em rigor, as raparigas da imagem acima, nem o próprio Ricardo Araújo Pereira. Mas a imagem moderna da nave espacial do comandante Meo e o futurismo que a publicidade convoca, além do styling, faziam adivinhar uma entrada fulgurante de novas tecnologias cá em casa, certamente pela mão de tipos com um ar vindo do futuro. Imaginei algo entre cientistas de cabelos em pé com ar endoidecido e técnicos de bata branca tipo laboratório de detergente que lava mais branco.

Era o mínimo.

Foi então que começou o sketch real do Gato Fedorento: entrou um “Zé Carlos”. Muito simpático, “Xô Pedro” para aqui, “Xô Pedro” para ali, porém um “Zé Carlos” de proeminente barriga e óculos embaciados pela gordura, pólo “USA style Gaps”, ao pescoço um colar Meo cheio de chaves na ponta, uma caixa de ferramentas do Aki, e sorrindo apresentou a sua arma secreta: “Trago o carrinho para não ter de carregar o material à mão, ah poizzzéé!”. O carrinho, vindo da nave espacial Meo, é este que fotografei às escondidas do amigo Zé Carlos...

O amigo Zé Carlos chegou às 10 da matina, mas ao meio-dia e meia desistia da primeira fase: “Óh Xô Pedro, ela vem dali, tinha que vir dar aqui, ela tinha que vir aqui ter, mas tá a ver? O verde não acende. Na vem. Ela na vem, na sei se é um cabo encravado, se é daonde... Vou ter de ir lá à central, o Xô Pedro vai-me desculpar”.

“Ela” era a linha telefónica, presumo. Não chegava. Mas “tava mesmo ali na coluna...”

Eu desculpei. Passada uma hora, o “Zé Carlos” voltou com mais dois colegas: um não falava, soltava raramente um “hmmm”, tinha um boné de ciclista com a pala virada para trás, uma tampa de caneta a fazer de palito no canto da boca e era estranhamente parecido com um dos rapazes que tornaram famoso o balcão do BES de Campolide; o outro, parecia saído de um “especial Gato Fedorento” dedicado ao pinta da Madragoa. Foi esse encarregue de me explicar o funcionamento do comando “meo”: “Só tem de clicar, o senhor só tem de clicar, pode alugar um filme de qualquer estilo, um português, um comédia, um trailer (era thriller...); vá, vamos clicar, vamos trabalhar aqui a bola como se fosse um jó-stick, vamos lá, carregue, carregue... É extremamente fácil!”.

E era. Mas o primeiro Zé Carlos ainda não tinha almoçado: “Não comeste nada, nem uma bucha? Epá, vai lá comer uma bucha que eu acabo isso, tens aí a ferramenta? É que ele tem de ir até ao fundo, metes o cabo até ao fundo, senão o gajo não liga”.

A meio da tarde a operação estava terminada. O Meo funcionava perfeitamente e, até agora, não tenho protestos nem reclamações, só mesmo um certo fascínio pela inteligência da máquina e das suas performances...

... Mas o episódio deixou-me a pensar no lado efectivamente humorístico do meu dia perdido: as campanhas mostram o futuro, o espaço, raparigas lindas, o comandante, naves espaciais e arquitectura muito lá à frente... Mas a realidade mete bonés de pala ao contrário, barrigas mais tugas do que a minha, “jó-stick”e trailer, “ela vem dali mas não chega aqui”, e “uma bucha” para “acamar”. A realidade dá sempre mais vontade de rir do que a ficção. Ainda por cima é mais barata.

29
Out08

Claro que sim

Para assinar é AQUI

 

"A ampliação da capacidade do terminal de contentores de Alcântara que o Governo inoportunamente se propõe levar por diante implicará a criação de uma muralha com cerca de 1,5 quilómetros com 12 a 15 metros de altura entre a Cidade de Lisboa e o Rio Tejo.
A zona de Alcântara estará sujeita a obras durante um período previsto de 6 anos, impossibilitando assim a população de aceder ao rio pelas “Docas”, levando ao fecho de toda a actividade lúdica desta zona, pondo em risco 700 postos de trabalho.
Os terminais de contentores existentes nos portos de Portugal no final de 2006 tinham o dobro da capacidade necessária para satisfazer a procura do mercado.
O Tribunal de Contas em relatório de Setembro de 2007 sublinhava que a Administração do Porto de Lisboa (APL) é líder no movimento de carga contentorizada em Portugal, e apresenta desafogadas capacidades instaladas e disponíveis, para fazer face a eventuais crescimentos do movimento de contentores.
A prorrogação da concessão do terminal de contentores de Alcântara até 2042 que o Governo pretende concretizar com o Decreto-Lei n.º 188/2008, de 23 de Setembro, e que prevê a triplicação da sua capacidade afigura-se assim completamente incompreensível, desnecessária, e inaceitável para mais sem concurso público.
Apesar da lei prever 30 anos para a duração máxima das concessões, com esta prorrogação a duração desta concessão será na prática, de 57 anos, o que, tal como o Tribunal de Contas sublinha, impede os benefícios da livre concorrência por encerrar o mercado por períodos de tempo excessivamente longos.
Com esta decisão do Governo perde a Cidade de Lisboa, perdem os cofres públicos, perde o sistema portuário nacional, no fundo perdem os portugueses.
Em face do exposto, os abaixo-assinados vêm pelo presente meio solicitar à Assembleia da República que sejam tomadas as medidas necessárias para impedir este atentado estético e económico contra o País, contra Lisboa e contra os seus cidadãos, revogando o DL n.º 188/2008, de 23 de Setembro"

28
Out08

As caras daqueles safados, isso eu queria ver

Há uma porrada de dias que os jornais falam de Francisco Ribeiro, Clara Costa e Mário Peças, os “bons rapazes” que administravam a falida empresa municipal Gebalis (4,97 milhões de euros de prejuízo em 2006...), e que ao seu serviço se banquetearam pelo mundo fora em restaurantes fantásticos (gosto especialmente do Tragaluz de Barcelona, do Zuma, em Londres, e do clássico Gambrinus aqui de Lisboa...), dormindo nos melhores hotéis, viajando acompanhados e apresentando as facturas que eles próprios caucionavam...

Mas eu gostava de ver as caras deles. Gostava de os ouvir falar. Gostava de os ver sair de casa e ir à pastelaria ali da esquina. Gostava de saber os seus currículos, o que faziam antes e como foram parar à Gebalis – quem os convidou, quem concorreu a concursos ao lado deles, e o que fazem hoje em dia. Se são militantes dos partidos do costume. Se trabalham ainda para o Estado.

Os nomes deles nos jornais não me dizem nada se não vierem acompanhados de uma vida, uma biografia, um percurso. Quero perceber de onde sai esta gente que usa, abusa, esmifra, rouba, e depois desaparece sem deixar rasto. Ninguém mostra a cara deles? Só temos direito a ver os criminosos de vão de escada e os homicidas enlouquecidos pelo ciúme e traição?

26
Out08

Quarteto

 

Este quadro deixou-me desolado. Então parei o carro e fui fixar a imagem. O “Quarteto” já fechou há algum tempo, mas nunca mais tinha passado por lá, nem sabia que o espaço estava à venda, embora mantendo a fachada de sempre. Dói mais quando se confronta o passado glorioso com a insignificância do presente.

Depois dos cinemas da infância – Alvalade, Caleidoscópio, Apolo 70... -, o Quarteto foi a sala que me ensinou a ver filmes, que me fez crescer e me mostrou que havia mais cinema para lá do óbvio. Vivi lá boa parte das noites da minha juventude, antes dos copos no Bairro Alto, antes das noitadas a namorar pela Avenida de Roma.

É evidente que o mercado manda, e se o Quarteto fechou foi seguramente porque muita gente deixou de o frequentar, e porque talvez tenha deixado de fazer sentido um espaço com aquelas características. O mercado é soberano e o tempo é fatal. Não defendo a existência subsidiada nem o culto do prejuízo. Mas nem por isso deixo de sentir tristeza sempre que desaparece um bocado da minha vida, ou um bocado do cenário onde vivi. Aquele cartaz “vende-se”, assim gritado e agressivo, deixou-me incomodado e muito triste.

Nem sempre o coração consegue aceitar a razão, é apenas isso.

 

24
Out08

Crítica cómica

Em Portugal, mais previsível do que um Governo em ano de eleições, só mesmo a crítica de música. Anunciem-me um disco e dir-lhes-ei o que “eles”, os críticos, dizem.

Vejamos então o que se passa com “Metafonia”, o trabalho que marca o regresso da Madredeus na versão “Madredeus e a Banda Cósmica”. Começa por haver diferenças na nomenclatura (e isso deveria dar que pensar aos “comentadores”...), mas na realidade há diferenças por todos os lados. Há Madredeus na matriz de cada tema, mas há todo um novo mundo por cima dessa matriz. Isso é indiferente à crítica: há anos que ignorava ou desprezava a Madredeus porque, dizia, andava sempre a fazer o mesmo disco, a repetir e repisar a fórmula, já não se podia ouvir, dava sono. Agora, os mesmos críticos recordam com saudade a fórmula que antes os adormecia e arrasam o disco novo por ser diferente e sair fora do que esperavam...

Como quem diz: antes não queríamos saber porque não mudavam, agora não gostamos porque mudaram. Eu leio estas patetices e até fico na dúvida na hora de comprar o disco. Mas compro.

E gostei de ser surpreendido com uma paisagem musical nova, porém com uma origem que me foi familiar; gostei de ver os horizontes alargados, as influências asiáticas e africanas, a fina mistura de sons de origens díspares; preferia vozes mais distantes da voz de Teresa Salgueiro, mas ainda assim encaixei a transição e percebo o percurso que o futuro certamente definirá; rendi-me à riqueza dos arranjos, da musicalidade transversal, até mesmo à aparente leveza de brincadeiras inconsequentes como a muito falada “Caipirinha”... Admiro a coragem de conceber faixas instrumentais com 11 minutos (e alguma cantadas...). Senti liberdade de criação e talento qb.

Ou seja: onde a critica se enfastiou porque a Madredeus já não é como era, eu gostei que fosse um passo em frente; onde a mesma critica ficou sem rótulos para a diversidade da obra (eu li algures a designação “som foleiro” para caracterizar este disco...), eu vi a inteligente resposta à ideia - “o mesmo disco de sempre” - que pairava sobre Pedro Ayres Magalhães.

Gostei desta “Metafonia” e vou passá-la abundantemente na Antena 1, em casa, e no carro. Quanto aos críticos, está na hora de fazer com eles o mesmo que se vai fazendo com os jornais - torná-los gratuitos. Na verdade, é por termos a critica que temos que as vendas dos discos nunca reflectem a generalidade da opinião publicada. Ao menos isso...

 
 

PS: Sábio, sensato e inteligente, o meu amigo JG, antes de tudo, disse-me que ainda ia ouvir mais duas vezes antes de chegar a uma conclusão. Ele estava na dúvida – porquê? Porque sendo ele crítico há muitos anos, não se deixa cair na tentação de ser previsível. Ele até pode não gostar – mas quando escrever, saberá fazê-lo com consistência e propriedade. É a excepção que sempre convoco.

22
Out08

Sobre o talento e os acasos

 

Um dia, em 1995, coloquei um anúncio no “Público” porque precisava de um/uma jovem jornalista, “em conta”, que ajudasse numa série de projectos de rádio e imprensa que coordenava na minha pequena empresa. E estava para nascer também o DNA. Recebi mais de 600 respostas. Com currículos e cartas e textos foi difícil chegar a 20 seleccionados, e desses vinte escolher dois. Fiz esse trabalho solitariamente, com a preciosa ajuda da Carmo Aragão de Barros, cujo faro profissional era bastante eficaz. Escolhemos um rapaz e uma rapariga. O rapaz acabou por mudar de cidade e, com isso, mudar de vida. A rapariga chamava-se Sónia Morais Santos e é hoje editora-executiva da Time Out e o mais que sabemos.

Esta é uma história feliz de que me orgulho muito. Costumo dá-la como exemplo, sempre que se diz que neste universo só as amizades e as cunhas garantem carreira (bom, na verdade começo a perceber por que se diz, mas isso agora não interessa nada...).

Nas nossas vidas, no entanto, as histórias têm sempre reversos que contrariam as que damos como exemplo. Já depois de ter começado a comentar blogues para a Antena 1, e a entrevistar pessoas que achei interessantes a partir de blogues, conheci e gravei um programa com a Mónica Marques. Elogiei-a muitíssimo, e falei-lhe longamente sobre até onde podia ir o talento que tinha. Às tantas, ela lá tirou a pedra do sapato: durante anos, tinha tentado a sua sorte mandando-me currículos e procurando falar comigo, na perspectiva de vir a colaborar no DNA. Parece que nunca a atendi, nunca lhe respondi. Nem me lembrava de tal facto. E ali eu estava a reconhecer-lhe o que antes me tinha escapado. Justa e merecidamente, porém um pouco tarde...

Conto as duas histórias porque separadamente têm um valor relativo – mas juntas, têm o valor absoluto dos acasos e circunstancias que as determinaram. A Sónia e a Mónica são duas excelentes escritoras. Quis então o acaso que os seus percursos fossem radicalmente diferentes – quando podiam ter sido estranhamente parecidos, inversos ou nada disso. Quis, no entanto, o talento, que mais tarde ou mais cedo experimentassem o prazer de ver o nome na lombada de um livro.

De alguma forma, sinto-me consolado. Ou será perdoado? Na verdade, a palavra mais certa é esta: feliz. Foi como fiquei quando vi a capa do livro da Mónica.

21
Out08

Alguém devia explicar à Dra. Ferreira Leite

 Que ser realista não é sinónimo de ser catastrofista.
Que ser sério não é sinónimo de ser chato.
Que ser ponderado não é o mesmo que ser refém de estudos.
Que ser assertivo não é o mesmo que ser repreensivo.

Que não alinhar em discursos demagógicos e populistas não é sinónimo de discurso nenhum.

Que prevenir não é o mesmo que desconfiar.

Que pretender dominar matérias não se deve confundir com ser escolástico.

... E que, por fim, para se ganhar confiança, credibilidade – e, vá lá, eleições – é essencial ter uma ideia para o país. Uma ideiazinha que seja. A única ideia que transpareceu, ontem à noite, das palavras da líder do PSD foi, a bem dizer, uma má ideia: a do abismo ao virar da esquina. Já sabíamos, obrigadinho.

16
Out08

Sem cabeça

O jogo de Portugal com a Albânia pareceu-me uma excelente metáfora sobre o próprio país e o estado em que se encontra:

Vive quase a conseguir, quase a lá chegar, quase a vencer. Não vence e tem sempre uma desculpa que vem do exterior, uma conjugação desfavorável, algo que lhe escapa. Como se o futebol fosse surpreendente, como se à última hora as balizas mudassem de dimensão. A selecção confronta-se com a cauda do campeonato mostrando a superioridade do pelotão da frente – mas depois, na hora da verdade, deixa-se infectar e comporta-se como se fosse o carro vassoura do planeta. Organiza-se para conseguir, mas desorganiza-se quando tem de conseguir. Parece uma equipa, mas não é. Tem espírito, mas não tem corpo. Acima de tudo, não tem cabeça.

 

(Com Scolari, ainda tinha um pai que lhe abria caminho – agora, é uma selecção perdida entre as genialidades individuais de rapazes que sabem jogar à bola. O que não é exactamente o mesmo que jogar futebol...)

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Gisela João O doce blog da fadista Gisela João. Além do grafismo simples e claro, bem mais do que apenas uma página promocional sobre a artista. Um pouco mais de futuro neste universo.

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