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Pedro Rolo Duarte

28
Ago11

No momento do balanço…

Este foi certamente o mais estranho mês de Agosto de sempre, desde que me lembro de haver meses de Agosto (o que também não é assim há tanto tempo, lembro-me de tão poucas coisas).

Mas sim, foi um mês estranho.

Houve talvez uma única noite de calor, daquelas em que adormeço ao ar livre e acordo com a alvorada enquanto me coço com o que resta do campo de batalha das melgas.

Não houve dois dias seguidos consequentes – se havia mais calor também tínhamos mais vento, se o mar ficava calmo e suave, logo a chuva vinha estragar tudo. Parecia um mês desapontado com a vida.

Foi o pior mês de sardinhas desde que gosto de sardinhas – ou seja, desde há 20 anos. As melhores que comi, assei-as eu mesmo debaixo de chuva, num instável equilíbrio entre o umbral da casa e as goteiras que me deixaram encharcado.

Foi um mês de marés esquisitas, ventos desencontrados e chuva. Ou sol inclemente sem compensação.

Foi um mês normal porque perdi mais um torneio de Uno – coisa que sucede com metódica regularidade desde que o meu filho sabe o que é Uno. Mas foi anormal porque cheguei a estar a ganhar-lhe 7-1, o que é fora do comum.

Foi um mês de estranhas relações, ou de inesperados encontros e desencontros. Ainda não “estou capaz” de perceber.

E é um mês que termina sem fim. Sem fecho. Os jornais do fim-de-semana são fracotes. O tempo nem sim nem sopas. O mar nem sim nem sopas. O vento, sempre o vento.

Este foi um estranho mês de Agosto. Por mim, passo.

27
Ago11

Como se fosse café

Tudo o que se banaliza perde graça – não no sentido engraçado, mas no sentido do estado em que as coisas boas se devem manter. Nos últimos anos, por causa desta coisa das redes sociais e da internet, o verbo “partilhar” – que tinha algo de ingénuo, familiar e de esquerda, não deixando de ser afecto à religião, o que de alguma forma lhe dava ainda mais “graça” – passou de “in” a “out” a uma velocidade estonteante.

Nunca me apetece dizer partilhar, mesmo quando é disso que se trata.

Como agora. Costumo dizer – já o escrevi aqui, estou careca de o dizer na rádio - que as crónicas do meu Amigo Miguel Esteves Cardoso no Publico são o meu “café da manhã” de todos os dias (com a sorte minha, e a trabalheira dele, de não descansarem nem ao domingo). Sei que “café da manhã” é a expressão brasileira para pequeno-almoço, mas uso-a nesse dúbio duplo-sentido: primeira refeição e primeiro café do dia.

Ontem à noite, estava a trocar mails com o próprio, e saiu-me a expressão que melhor define a minha forma de começar a manhã: eu leio diariamente as crónicas do Miguel como se fossem café.

Não são o meu café da manhã, são mais do que isso: são o que seria o café se o café pudesse vir com o Público.

Como o Público não inclui café, ali está o café que então seria. Não dispenso. Bebo sempre. Faz parte da minha (melhor) rotina. E no fim arrasto o sabor até ao limite.

Sem café, não sou.

Claro que me lembrei do “como se fosse água” do Saramago. Mas há toda uma diferença que ambos sabemos - e mais uma pessoa sabe.

Fica então assim e que se lixe, “partilho”: leio todos os dias as crónicas do Miguel como se fossem café. E são.

24
Ago11

Génio

Beirut a interpretar o Leãozinho? Beck e Seu Jorge juntos? Marisa Monte de volta aos melhores momentos? E Bebel Gilberto? E Céu? E Fernanda Takai com Moreno Veloso à volta de Águas de Março?

Não, são só fait-divers – o duplo disco que, 15 depois, traz de novo à luz do dia a marca “Red Hot + Rio” é, para mim, apenas o melhor disco que a musica popular produziu este ano. Estamos em Agosto, bem sei, mas fica o avanço...

Saiu no Brasil em Junho, chegou agora ao nosso mercado. Tal como na primeira versão, é uma iniciativa da Associação de luta contra a SIDA Red Hot e desta vez os focos estão sobre o movimento tropicalista brasileiro. A mistura de nomes, géneros, talentos e gerações faz deste disco – e das suas 33 canções, versões e invenções – um monumento de criatividade, génio e talento. Há dois dias que não consigo ouvir mais nada.

Aviso ao João Gobern: nas próximas três semanas, é o meu disco de eleição para o nosso Hotel...

23
Ago11

O que eu peço de um filme que escolho ver

(e quando faço a lista, ela não é cumulativa – basta que o filme preencha um dos requisitos...)

 

Que me surpreenda ou revele.

Que me comova ou me emocione.

Que me faça rir ou me deixe em alta.

Que me ensine ou explique.

Que me entretenha.

Que me “disponha bem”, expressão que não uso mas gosto.

Que me recorde ou simplesmente me acorde.

Que me dê um murro no estômago.

Que me apanhe na curva e eu alinhe.

 

Por este mesmo elenco argumentativo, há anos que deixei de ver filmes que:

 

Me surpreendem pelos piores motivos.

Me dêem murros no estômago mas ao mesmo tempo me macem.

Me deixem com o rabo plano de tantas horas sentado.

Me ensinem o que não quero aprender.

Me mostrem o que não quero ver.

Me contem uma história longa, comprida, chata e que mora longe.

Sejam chatos, compridos, mas “obrigatórios” porque a critica diz, ou o Festival de Sundance premiou, ou passou em Cannes fora de competição.

Sem história, ou sem argumentos, ou sem diálogos, ou sem actores. Ou sem qualquer destes elementos. E há imensos.

 

Dito isto, aguentei estoicamente as duas horas e meia que dura o muito premiado e estrelado “Vénus Negra” e só posso dizer: pertence à categoria dos filmes que deixei de ver há anos. Mas é como um domingo de praia na Costa da Caparica – todos os anos caio uma vez. Já está.

23
Ago11

Há 20 anos, uma luz

O começo de um tempo de esperança. De alguma maneira, este foi um ponto de partida para uma década que tinha tudo para ser prodigiosa.

Ilusória esperança, prodigiosa desilusão...

 

22
Ago11

O Dia Deu em Chuvoso (esperemos que hoje, segunda, as coisas mudem...)

O dia deu em chuvoso.

A manhã, contudo, esteve bastante azul.

O dia deu em chuvoso.

Desde manhã eu estava um pouco triste.

 

Antecipação! Tristeza? Coisa nenhuma?

Não sei: já ao acordar estava triste.

O dia deu em chuvoso.

 

Bem sei, a penumbra da chuva é elegante.

Bem sei: o sol oprime, por ser tão ordinário, um elegante.

Bem sei: ser susceptível às mudanças de luz não é elegante.

Mas quem disse ao sol ou aos outros que eu quero ser elegante?

Dêem-me o céu azul e o sol visível.

Névoa, chuvas, escuros — isso tenho eu em mim.

 

Hoje quero só sossego.

Até amaria o lar, desde que o não tivesse.

Chego a ter sono de vontade de ter sossego.

Não exageremos!

Tenho efetivamente sono, sem explicação.

O dia deu em chuvoso.

 

Carinhos? Afetos? São memórias...

É preciso ser-se criança para os ter...

Minha madrugada perdida, meu céu azul verdadeiro!

O dia deu em chuvoso.

 

Boca bonita da filha do caseiro, Polpa de fruta de um coração por comer...

Quando foi isso? Não sei...

No azul da manhã...

O dia deu em chuvoso.

 

Álvaro de Campos/Fernando Pessoa in "Poemas"

Lido aqui

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