Um pouco de política, entre dois mergulhos
Tenho estado um bocado calado no que à politica diz respeito – mais por estar de férias e querer mesmo descansar a cabeça do que por não ter o que dizer.
Tenho, sim. Quando me der para aí, direi. Apetece-me muito criticar este Governo porque vai matar o serviço publico de rádio e televisão, gostava de perceber esta história de Miguel Relvas e Mário Crespo, ainda não entendi bem esta coisa dos concursos públicos com aprovação da tutela. Ou seja: por entre sinais de boa governação, vejo sinais de “mais do mesmo” que me fazem lembrar o passado (muito recente).
Mas para já, e com o corpo meio mergulhado no mar, só me apetece desabafar: é de uma imensa falta de sentido democrático o comentário que me vai caindo no blog (e que eu, invariavelmente, mando às urtigas), “ah, e tal, votou neles, e agora critica?”.
Pois é, votei “neles” – o que me dá legitimidade bastante para criticar, elogiar, ou apenas fazer um “like”. A vantagem das pessoas livres é que dependem apenas da sua consciência. E, oh glória das glórias, até podem dar-se ao luxo de mudar de opinião. É por isso que votamos de quatro em quatro anos, e não apenas uma vez até à eternidade.
Se eu fosse como o João Gonçalves e tivesse baixado a bolinha e perdido toda a “massa critica” (tantas vezes misturada com arrogância e soberba…) porque agora estava no Governo, era obviamente uma alforreca. Se eu tivesse manifestado o meu voto e a seguir me sentasse numa cadeirinha do poder, como alguns meus conhecidos, era obviamente uma alforreca. Se eu estivesse aqui a dizer ámen ao governo só porque votei nele, era obviamente uma alforreca. Se eu fosse jornalista nos intervalos de ser assessor, era obviamente uma alforreca. Se eu criticasse agora o que antes elogiei, era obviamente uma alforreca.
Mas não sou uma alforreca. Votei “neles”, não deixando de lamentar a minha incapacidade para insistir no voto socialista, que é a minha praia há muitos anos. Ao fazê-lo, manifestei independência face aos dois – e naturalmente, fiquei do lado de fora desse círculo do centrão. Fico sempre. Ainda não me arrependi do meu voto – mas tal como sucedeu com o PS de Sócrates, pode ser uma questão de tempo.
Cabe aqui uma história breve:
Um dia, há uns anos, um ex-amigo meu (e talvez o que vá contar explique porque é hoje ex…) levantou-me a voz numa discussão à mesa de jantar e disse-me:
- Pedro, acabou o tempo da ingenuidade. Não podemos continuar neste limbo, nem de um lado nem do outro. Temos que nos assumir. Eu não vou continuar armado em independente e sempre lixado – eu vou alinhar num dos lados e vou fazer a minha vida.
Estupefacto, respondi-lhe algo como:
- Pois eu, népias. Vou continuar não-alinhado. Vou continuar como sou.
Ele ainda disse algo do género – “então estás lixado, não vais passar da cepa-torta” – e começou aí o fim da nossa amizade. Não me parece que ele esteja hoje nos píncaros, mas percebi a sua atitude debaixo deste chapéu dos comentários que às vezes me fazem por aqui. Parece que temos de estar de um lado ou do outro senão resta-nos o degredo da vida comum, pobre e anónima.
Tenho pena, mas vou continuar assim. A votar no que me parece adequado a cada momento, e critico de uns e de outros, no dia seguinte, sem esquemas nem fezadas nem apostas em lugares de estado. Fui convidado para lugares simpáticos e generosos num governo PSD e num governo PS. Recusei ambos. Já percebi que vou morrer pobre – mas durmo como um anjo.
E não enfio a carapuça dos Gonçalves desta vida. Como ele diria se ainda se lembrasse como se diz, “apre”!