O espectro do medo
A notícia é a que se sabe: “O homem de 25 anos que foi detido no domingo passado em Elvas por difamar o Presidente da República, Cavaco Silva, foi condenado em tribunal a uma multa de 1300 euros”.
Parece um fait-divers mas não é um fait-divers.
Parece uma notícia de segunda, mas é uma notícia relevante. Tanto mais relevante quanto é certo que ocorre duas semanas depois do episódio “palhaço”, que envolveu Miguel Sousa Tavares e o Presidente da Republica.
Interessa pouco se os agentes da autoridade agiram antes ou depois de consultarem a Presidência da Republica.
Interessa mesmo é notar que foi preciso chegarmos a 2013, e termos Cavaco Silva na Presidência, para um homem ser julgado e multado por ousar gritar a sua indignação na rua, chamando dois ou três nomes menos razoáveis ao Presidente e, de passagem, mandando-o trabalhar.
Tudo o que qualquer de nós, em algum momento, alto ou baixo, na rua ou em casa, já fizemos. Com este Presidente, com os anteriores, com Governos e governantes de qualquer área.
O insulto na rua, ou o beijinho na feira, a indignação ou a lambe-botice, fazem parte do “pacote” da actividade pública de qualquer político. Todos o sabem, é o jogo da política. Mesmo que juridicamente um impropério gritado na rua possa ter consequências, não há quem se queixe, condene, ou reclame. Nem José Sócrates, o tal animal selvagem, tentou entrar por essa noite escura.
Foi com Cavaco Silva que se abriu o precedente. Em duas semanas, por duas vezes, o espectro do medo pairou sobre a nossa liberdade de expressão. Não bastava a crise.