Agora querem nacionalizar o Ronaldo...
Acho extraordinário que se discuta horas a fio Portugal, os portugueses, e “a marca”, sob o chapéu colorido de uma vitória individual. Na “palheta”, somos realmente notáveis...
... Mas a conversa da marca e do orgulho nacional não retiram um pingo à meridiana realidade das coisas: Cristiano Ronaldo é o melhor jogador de futebol do mundo por mérito dele, exclusivamente dele, só dele. Portugal contribuiu com o argumento menos relevante: um bilhete de identidade.
Da mesma forma que Maradona é argentino mas não é Argentina e Beckham é inglês mas não é Inglaterra, também Ronaldo é português mas não é Portugal.
Ronaldo não é o melhor do mundo porque Portugal fabrica génios, porque investe na prática do futebol, porque “lhe deu oportunidade”. Nada disso. Cristiano Ronaldo é o resultado excepcional de um trajecto absolutamente normal: putos que jogam à bola, olheiros que os topam, clubes que os formam, exploram e vendem. Deu-se o caso de ele ser notável. Mas sublinhe-se a construção frásica: é ele que é notável, não a sua condição de português ou de produto nascido de uma certa forma de ser português.
Estamos perante uma vitória individual. Mérito, paixão, dedicação e génio. Neste caso até me apetece citar José Sócrates: Ronaldo joga à bola enquanto o resto do país descreve o jogo da bola.
Aproveitar esta vitória individual para, como agora é moda dizer-se, “cavalgar” a onda da glória nacional, é pura demagogia. Para não dizer hipocrisia. Percebo que faça falta ao espírito e ânimo da nação – mas é mais uma daquelas patranhas só comparável à publicidade da “west coast”. Adoramos propaganda e fogo de artificio, é um facto.