Excelência
Porém, essa é a palavra que me ocorre quando penso na noite extraordinária que vivi – eu e mais 40 mil pessoas – no Estádio do Restelo, rendido à - lá vai... - excelência dos Xutos & Pontapés.
Ocorre-me “excelência” pelo feliz encontro de itens que nem sempre coincidem no tempo e no espaço: qualidade da música e de quem a executa, relação emocional forte com a audiência, consistência global do espectáculo, recursos técnicos e de produção acima da média e utilizados com sentido e sensatez.
Aos 30 anos de vida, os Xutos conseguem ser transversais a várias gerações, e o tempo entregou-lhes a bandeja da unanimidade. Podiam tê-la ignorado ou com isso ter ganho presunção e vaidade. Mas não. Eles são os mesmos miúdos que nasceram a gostar de rock. E a quem os anos deram maturidade, sabedoria, virtuosismo, e por outro lado doses generosas de humildade.
A genuína felicidade com que se apresentaram, no meio do gigantesco circo técnico montado à volta deles, foi comovente. A forma como se deram ao público e quebraram a natural distancia entre um palco possante, de grupo rock internacional, e uma plateia onde estavam todos os fieis dos tempos em que a luz ia abaixo e os geradores se ouviam durante as baladas, foi um manifesto de inteligência e sensibilidade.
O resto, bom, o resto foi só talento, energia, amor à música, e uma colecção de grandes canções rock.
Saí do Restelo em estado de graça. Sinceramente emocionado, agradecido, e feliz. O meu filho, que não era ouvinte militante da banda, rendeu-se e confessou-se impressionado.
E eu fiquei a pensar na palavra “excelência” e como ela aqui faz todo o sentido. É de excelência que se trata. E se Zé Pedro exagerou nos agradecimentos ao público, não é exagerado devolver os agradecimentos à banda. Nós é que estamos gratos aos Xutos & Pontapés.
Hoje é dia de votar – e o concerto de ontem recordou-me, caso pudesse esquecer-me, que um país é sempre a sua língua, a sua cultura, e aqueles que criam - e nunca, jamais, os políticos que gerem os tempos entre votos. E isso deixou-me em paz: criadores e talento, isso temos. Quanto a quem nos governa, esperemos que a memória dos eleitores seja eficaz. Ou seja: não faça esquecer.
PS – Só mesmo um concerto notável faz apagar, ou pelo menos acalmar, a fúria pelo caos que constituiu a entrada no Estádio do Restelo. Gostava de saber quem foi o bando de amadores incompetentes responsável por aquelas horas de filas intermináveis, indicações zero, e por fim o regabofe da entrada quase selvagem, sem quaisquer medidas de segurança ou sequer verificação de bilhetes. Lamentável.