Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Pedro Rolo Duarte

13
Jan08

Uma crise (meramente) literária

Há ideias feitas, lugares comuns e terríveis mentiras que entram nas nossas vidas de tal forma que mesmo depois de denunciadas e desmentidas persistem em colar-se-nos à pele. Uma das mais frequentes diz respeito ao negócio dos livros em Portugal. Foram tantos anos a ouvir editores, autores, jornalistas, a encostarem a palavra “crise” ao mundo da edição, que a ideia pegou de estaca e não o larga mais. É como identificar o Porto com o vinho adocicado: faz parte e é óbvio.

Quinta-feira, na revista Visão, a jornalista (sénior...) Ana Margarida Carvalho, num trabalho sobre a nova livraria Byblos (investimento do projecto: 5 milhões de euros...), lá vem com a frase fatal: “Pode parecer paradoxal tanto investimento num apregoado sector em crise”. E a seguir o eterno argumento da iliteracia.

Crise? Qual crise?

De uma vez por todas: foram vendidos 530 milhões de euros em livros no ano 2006; importaram-se 62 milhões de euros de livros no mesmo ano; editam-se em Portugal mais de 15 mil títulos por ano (41 livros por dia!); o break-even médio de um volume situa-se nos 2000 exemplares vendidos (ou seja, é mais fácil editar um livro e não perder dinheiro do que ver o Benfica ganhar a liga num período de 10 anos...).

Outros números discretos: entre os clubes com maior número de sócios encontra-se o Circulo de Leitores. Tem 300 mil quotizados que se obrigam a comprar pelo menos um livro por trimestre. O novo grupo editorial Leya, que reúne um vasto conjunto de editoras de todos os estilos, anunciou na semana passada a intenção de, em 2008, editar mil novos títulos e facturar 90 milhões de euros. O mesmo grupo anunciou que em 2007 facturou 20 milhões de euros exportando livros escolares para Angola e Moçambique.

(De passagem: as vendas brutas de “Rio das Flores” representam, ao fim de dois meses, um encaixe de 4,5 milhões de euros na Oficina do Livro; e as vendas de “Sétimo Selo”, de José Rodrigues dos Santos, foram responsáveis por mais de 2,6 milhões de euros de facturação na Gradiva...)

Factos incontornáveis: abrem editoras novas a todo o momento. Não se ouve falar no fecho de editoras antigas. Há grupos financeiros a comprar editoras – não vejo grupos a vendê-las. Há editoras a investir em Portugal (o exemplo “Esfera dos Livros” é exemplar), não vejo desinvestimento.

Há mais FNAC’s do que alguma vez o grupo sonhou abrir neste cantinho, nasceu a Byblos, 2008 trará novos espaços comerciais.

O livro, em Portugal, está de boa saúde e recomenda-se. Os editores “choram-se”, porque lhes está na massa do sangue a queixa e a lamúria. Os livreiros queixam-se – mas conhecem algum comerciante que não faça outra coisa senão queixar-se e cuja frase chave não seja “este ano piorou muito...”? Queixam-se os autores, mas só aqueles que vendem pouco (infelizmente a maioria). E por fim reclamam os críticos, porque na verdade os livros que mais vendem e justificam todo este movimento financeiro não são aqueles que eles mais valorizam. Mas também esse fenómeno é um clássico.

Dito isto, era altura de aceitar pacificamente que o mercado do livro em Portugal vive melhor do que a maioria dos seus familiares, nomeadamente a música ou o teatro. Vive o melhor possível. Neste momento cheio de vitalidade. E a nadar em oportunidades. Quem as tiver, chame-lhe suas.

25 comentários

Comentar post

Pág. 1/2

Blog da semana

Gisela João O doce blog da fadista Gisela João. Além do grafismo simples e claro, bem mais do que apenas uma página promocional sobre a artista. Um pouco mais de futuro neste universo.

Uma boa frase

Opinião Público"Aquilo de que a democracia mais precisa são coisas que cada vez mais escasseiam: tempo, espaço, solidão produtiva, estudo, saber, silêncio, esforço, noção da privacidade e coragem." Pacheco Pereira

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Mais comentários e ideias

pedro.roloduarte@sapo.pt

Seguir

Arquivo

  1. 2017
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2016
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2015
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2014
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2013
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2012
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2011
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2010
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2009
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2008
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2007
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D