Duas ou três notas (sobre Portugal, claro)
Primeira. Segundo noticias que leio, invariavelmente, na imprensa, todos os jornais vendem mais, embora na verdade vendam menos. E todos vendem mais quando oferecem coisas que os fazem valer menos. Mas ninguém quer saber disso.
Segunda. Há 14 anos que, por razões pessoais, “faço” com alguma regularidade a estrada mais feia de Portugal: a que liga a A-2 a Sesimbra. É a estrada que passa em Fernão Ferro, esse monumento ao nosso terceiro-mundismo (ou será terceiro-mundíssimo?), onde as piscinas estão viradas para o céu mas nunca viram água, há a maior concentração nacional de animais em louça e barbecues descartáveis, e os carros que circulam à minha frente são sempre aqueles que vão virar à esquerda, onde menos se espera, sem fazer pisca.
Bom, nessa estrada está há 14 anos uma placa, algures entre Fernão Ferro e a Cotovia, que diz “Atenção: bermas em mau estado”. Pensei, no começo, que era uma provisória, um aviso. Depois, com o passar dos anos, passei a imaginar que seria uma bandeira (esquecida…) de autarca em tempo de campanha eleitoral, ou uma homenagem transitória a alguma vítima de acidente no local. Passados 14 anos, verifico que a placa é definitiva. Foi uma “atenção” para sempre. Algo como: “se esperam que a autarquia ou quem quer que seja tome conta das bermas, para onde vocês têm de se atirar quando um maluco qualquer decide virar à esquerda, tirem o cavalo da chuva: estas bermas SÃO em mau estado”. Não estão, são. A diferença entre o estar e o ser é o que nos separa dos países civilizados - nós somos mesmo assim. E isso também explica por que motivo as placas de estrada dispensam os verbos: é mais fácil manter na dúvida, durante pelo menos 14 anos, incautos como eu.
Terceira. Ando há semanas a ler artigos na imprensa, e reportagens na televisão, sobre o regresso do concurso “Roda da Sorte”, agora na SIC. Fala-se de Nuno Santos, que apostou no programa, fala-se de Herman José, que o lançou e popularizou, fala-se de Ruth Rita e até da voz off de Cândido Mota. Ninguém – quando digo ninguém, é ninguém mesmo… - se lembrou de dizer que foi o produtor Carlos Cruz quem descobriu esse formato, o trouxe para Portugal, convidou Herman José para apresentar, e produziu o programa. Há esquecimentos que dizem mais sobre quem esquece do que sobre quem é esquecido.