Em Vila Viçosa
O design gráfico é talvez o vício que o olhar mais frequentemente denuncia em mim. Sem que queira, dou comigo agarrado a uma página de jornal, a uma capa de revista, a um logótipo de uma marca, estudando o caminho que originou a arte final, descobrindo os segredos daquela solução, pensando como resolveria se o problema me tivesse sido colocado. Se não fosse pela escrita, o meu caminho teria sido pelo grafismo, ou pela cozinha…
Ontem, andava à chuva em Vila Viçosa, Alentejo, onde sempre me sinto como se lá tivesse nascido, e o olhar obrigou-me a abrandar nesta esquina, nesta placa: por mais imperfeito que tecnicamente seja, o lettering usado na Rua Guerra Junqueiro, o desenho do “R” de “Rua”, a composição das diversas declinações do mesmo tipo de letra, impressionaram-me e mexeram com a minha sensibilidade. O autor desta obra de sinalética tinha do desenho da letra noções que escapam à maioria dos comuns artífices das nossas vilas e cidades. Fosse quem fosse, estava à frente no seu tempo. Lá tirei a máquina fotográfica do bolso.
… E depois, havia ainda a caracterização do nomeado, responsabilidade de quem na edilidade chegou a Guerra Junqueiro para nome de rua: “poeta ilustre”. É de uma desarmante e tocante simplicidade. “Ilustre” - que melhor designação para um poeta que, tendo nascido em Freixo de Espada à Cinta, dá nome a uma rua de Vila Viçosa? Afinal, trata-se uma transversal da Rua Florbela Espanca, ela sim, uma mulher da terra…
Mas na verdade o que me tocou foi o desenho e a composição deste lettering num domingo chuvoso de Dezembro no Alentejo. O resto é mais para compor o post, como se fosse um sinal gráfico que “arredonda” a página.