Lá me vou divertindo a digitalizar as minhas velhas cassetes VHS. Devagar, que a transcrição é muito analógica, isto é, em tempo real... Ontem passou-me o Dr. Durão Barroso pelo vídeo, e a memória de um programa em 1998... O avô dele disse, quando o viu no berço, que ele viria a ser Presidente da Republica. Nesta entrevista, aos costumes disse nada. Daqui a cinco anos, é mais certo do que dois e dois serem quatro...
Os Deolinda não fizeram uma canção extraordinária ou genial. Limitaram-se a escrever e cantar aquilo que uma geração (ou boa parte dela) sente. Essa é a história da melhor musica popular, aqui ou em Inglaterra, nos Estados Unidos ou na Islândia. É também por isso que é justamente chamada de música popular. E é o que se pede a uma banda que quer identificação com o público.
Não percebo a polémica sobre se a canção herda a tradição de José Afonso ou se dela se pode inferir que ficar em casa dos pais até aos 30 é uma herança do estado social impossível de sustentar. É tudo demasiado estapafúrdio para o meu gosto, e para o que penso. Se há um grupo alargado de pessoas que se identifica com o que se canta neste tema, então a canção cumpre o seu papel e pode ser comparada a todas as que, no seu devido tempo, fizeram o mesmo caminho. Só quem nunca estudou um bocadinho da história da musica popular do século XX ignora a função social da canção e a sua relevância nos movimentos geracionais de cada tempo.
Os Deolinda fizeram, no momento certo, a canção que milhares de pessoas querem ouvir. Até eu me reconheço quando oiço a excelente Ana Bacalhau cantar “Sou da geração ‘vou queixar-me pra quê?’ / Há alguém bem pior do que eu na TV”.
É claro que ter o ovo de Colombo à frente dos olhos e não o ver é incomodativo – especialmente porque os Deolinda o viram. Causa inveja, coisa humana infelizmente disseminada por todo o lado.
Mas estão de parabéns os Deolinda. Eu, que nem gosto especialmente da musica, canto com eles porque gosto de ver a música popular envolvida e embalada nos dias que correm. Há uns anos que não via este feliz envolvimento. Não deve ser por acaso.
Sou da geração sem remuneração e não me incomoda esta condição. Que parva que eu sou! Porque isto está mal e vai continuar, já é uma sorte eu poder estagiar. Que parva que eu sou! E fico a pensar, que mundo tão parvo onde para ser escravo é preciso estudar.
Sou da geração ‘casinha dos pais’, se já tenho tudo, pra quê querer mais? Que parva que eu sou Filhos, maridos, estou sempre a adiar e ainda me falta o carro pagar Que parva que eu sou! E fico a pensar, que mundo tão parvo onde para ser escravo é preciso estudar.
Sou da geração ‘vou queixar-me pra quê?’ Há alguém bem pior do que eu na TV. Que parva que eu sou! Sou da geração ‘eu já não posso mais!’ que esta situação dura há tempo demais E parva não sou! E fico a pensar, que mundo tão parvo onde para ser escravo é preciso estudar.
Para quem, como eu, gosta de cozinhar, e consome livros de cozinha como se fossem romances, não há nada pior do que tropeçar em palavras em inglês, francês, ou espanhol, que não conheço e que não consigo “tirar pelo sentido”. Nomes de peixes, de legumes, de bocados de animais, de condimentos, de especiarias. Nem sempre o computador está à mão para me explicar que um whelk é um búzio, ou cazador é, em espanhol, um cação. Não falando de um estornino (cavala), de orge (cevada), ou de um cernier (cherne). E misturei aqui inglês, espanhol e francês, que nem ouso ir ao alemão...
Tenho livros de cozinha maravilhosos a que dou pouco “uso” pela manifesta impaciência para andar do fogão para o computador a fazer traduções mais ou menos livres, ou ler na cama rodeado de dicionários.
Um destes dias, tropecei em 10 euros de livro sob o titulo “Dicionário Gastronómico Multilingue”. Assinado por Rodolfo Farinha, nome que merece o respeito de Alfredo Hervias e Mendizábal, tem 180 páginas num formato quase de bolso, é evidentemente limitado pelo espaço e, por isso, básico e essencial. São as palavrinhas simples – alho porro, amêijoa, chanfana, cabrito, grão de bico... – traduzidas sem delongas para inglês, francês, alemão e espanhol. E vice-versa, claro. Em lista e por ordem alfabética. Se não é edição de autor, parece (está lá um mail, caso não encontrem o livro: rolofa@netcabo.pt). Assim, sem luxos nem novos-riquismos editoriais, tem resolvido 80% dos meus casos de irritação alérgica resultante da ignorância que sempre me atormenta. Recomendo a quem sofra do mesmo problema.
Perdoem ao velho VHS os saltos de imagem e os frequentes desencontros – dessincronias... – entre som e imagem, mas acreditem que ele disse tudo certinho naquele dia 14 de Abril de 1997... Já então Pedro Passos Coelho não negava à partida uma liderança do Partido, e confessava que gostava de jogar às cartas. Sueca, disse ele...
São centenas de horas de programas produzidos e apresentados na RTP, SIC (Mulher) e TVI. Os primeiros datam de 1988. Os mais recentes têm meses. Não tenho tudo, mas tenho muito do que fiz em cassetes VHS que, devagar, vão apodrecendo no quarto dos fundos.
Decidi, devagarinho, passar tudo isso para digital, dvd, disco rigido. Uma memória como outra qualquer.
De vez em quando prometo uns minutos de TV-Memória-Pessoal aqui no blog. Ainda estou a aprender a editar, por favor perdoem alguns cortes mais radicais... Para estreia, um Miguel Sousa Tavares a dizer em 1997 o que tranquilamente poderia dizer em 2011. Ele e eu...
(Não vale comentários sobre como estávamos mais novos...)
Temos então a história de Augusta Duarte Martinho, que morreu há nove anos em casa, sozinha, e só agora foi encontrada, porque tinha uma divida fiscal de 1400 euros e viu a sua casa penhorada e leiloada (ler na integra aqui). E temos ao lado dezenas de histórias de tribunal sobre incidentes judiciais, recursos, contradições, anulações, repetições, desaparecimentos de provas, enfim, o disparate que é conhecido.
O que é que daqui resulta? O maior dos equívocos que uma democracia nos pode oferecer: a justiça, que devia ser cega, vê demais, enquanto o fisco faz de conta que é justo e mostra-se cego.
Por vicio pessoal e “defeito profissional”, tenho pensado sobre a mudança de paradigma que se abate sobre o jornalismo, os jornais e as revistas, com a banalização das mais recentes inovações tecnológicas associadas à Internet, especialmente o iPhone e o iPad.
Tal como os jornais tiveram que criar um conceito visual e editorial próprio para as suas edições na Internet - e na verdade, até hoje, ainda não há um modelo implacavelmente perfeito de jornal na rede, apesar dos anos passados -, também as novas máquinas carecem de conceitos que se enquadrem na plataforma e a enriqueçam, garantindo experiencias novas aos consumidores e um verdadeiro upgrade face ao “hardware” já existente, isto é, o velho e bom papel impresso.
No outro dia, em conversa com um amigo sobre revistas que se podem ler na Internet, chegámos a este momento absurdo e paradoxal: falávamos de páginas pares, impares e duplas-paginas, que víamos em revistas no computador. Às tantas, um de nós perguntou ao outro: mas faz sentido dividir páginas no ecrã de um computador? Não faz. Um anúncio da Dior de dupla página é apenas um rectângulo ao baixo num ecrã. Não tem uma divisão a meio. O formato clássico de uma página impressa é espúrio num computador. Porém, se o novo The Daily já percebeu esse facto simples – nasceu só no iPad, o que faz toda a diferença -, os jornais e revistas que estão a migrar para o iPad ou a partilhar a vida entre o papel e o online vivem na rede como se o ecrã fosse uma folha de papel, e até dão ao consumidor a ilusão do virar de página, como se efectivamente houvesse páginas para virar no iPad ou no portátil...
Ora, o que está ainda em ebulição neste novo universo comunicativo é justamente o modelo, a estrutura, a adaptação do que temos para comunicar com a plataforma através da qual comunicamos. Exactamente como a rádio “pediu” som e voz, tal como a televisão pediu imagem e som. A rede pede interacção e que mais? Pede como e o quê? Estas são as perguntas do milhão de dólares, a que os produtores de informação não parecem querer responder, entretidos que estão a criar modelos informáticos para “adaptar” jornais aos tablets.
A hora não é de adaptar – é de criar. Vencerá a batalha da informação na rede quem conseguir criar o modelo gráfico e visual, de edição e de periodicidade, que se adapte à plataforma, ao aparelho, e especialmente ao consumidor. Ou seja, que reinvente o produto e no limite volte a descobrir a roda...
O consumidor do futuro – e convém notar aqui que o futuro, neste caso, é hoje mesmo – não quer ver num ecrã plano uns pdf’s animados da sua revista habitual. Na verdade, a experiência sensorial e física de uma revista, do papel que se dobra, se sente, leve como ar e com cheiro próprio, é algo que faz inveja a qualquer construtor de hardware. Nesse sentido, “imitar” o papel num ecrã de tablet é mais ou menos como criar para a Playstations jogos “excitantes” como a sueca e o burro em pé. São jogos na mesma – mas não são jogos para um potencial tecnológico como a PS.
Tal como um projector de vídeo é prático e dá jeito, mas não leva o cinema a casa – leva apenas o filme -, também o iPad não servirá para “levar o jornal” a nossa casa, mas apenas a informação. É pobre para tanta riqueza...
É funcional consumir informação e ler num aparelho electrónico cheio de memória e ligado à rede – mas esse é apenas o ponto de partida. O consumidor não quer apenas saber as noticias – para isso compra o Kindle e assina a Reuters por meia dúzia de euros por mês, ou vê televisão no ecrã do seu tablet. O consumidor quer ter uma experiência no iPad comparável à que tem quando compra uma revista - mas agora num ambiente novo, com um potencial diferente. O consumidor quer um novo conceito de publicação – que potencia o meio, que se plasma nele, que se funde na tecnologia. Talvez queira revistas e jornais “em directo”, talvez queira novos conceito de design tridimensional, talvez queira o fim da ditadura das colunas de jornal e das fotografias rectangulares. Talvez nem saiba o que quer – mas não há duvida que, a breve trecho, não lhe chegará um jornal a cinco colunas ao alto e ao baixo no iPad, com umas fotos animadas e umas infografias que mudam de cor em 3-D. Isso era o mínimo – e já não chega.
Andamos todos à procura, certamente – mas aquilo que quem anda à procura parece estar a encontrar, está longe do potencial que as novas máquinas nos oferecem. Deram-nos o carro mas ainda estamos a tirar a carta de condução. Não é tudo estrada...
A minha amiga Blonde recebeu um mail, de longe, que quero partilhar:
"I sometimes think that the bad actor, in addition to wanting to get a lot of attention, is trying to see if I lose my temper. And, in a weird sort of way, I do everything I can to try not to... perhaps just to spite them? My personal mantra is "tormented children", because so many adults I interact with in the academy seem to fit that description...and I find that I have to be the accomodating one. And, in complete contrast, the real giants in the academy, as well as the real world, that I've been lucky enough to meet have almost all been incredibly humane. Strange, isn't it?"
Hoje acordei e, ao ler este mail, pensei assim: é claro que erramos sempre que dizemos “ah e tal, os portugueses são assim”, “já se estava mesmo a ver que era um tuga...”, “é mesmo português, esse...”. Nada disso. A blonde tem razão: somos todos, em toda a parte, tão mais iguais do que a diferença que aparentamos...
Gisela João O doce blog da fadista Gisela João. Além do grafismo simples e claro, bem mais do que apenas uma página promocional sobre a artista. Um pouco mais de futuro neste universo.
Uma boa frase
Opinião Público"Aquilo de que a democracia mais precisa são coisas que cada vez mais escasseiam: tempo, espaço, solidão produtiva, estudo, saber, silêncio, esforço, noção da privacidade e coragem." Pacheco Pereira
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