Não estou de acordo com boa parte do que Mário Soares disse ontem na TVI-24. Exagera factos, aproveita o descontentamento generalizado para empolar ideias, e até reescreve a História quando esquece o tempo em que nos mandou apertar o cinto às ordens do mesmíssimo FMI. Pior do que isso: fez um paralelo com a ditadura e afirmou que este tempo é pior do que o de Salazar, quando em Portugal sobrava em miséria o que faltava em liberdade. É de uma infelicidade sem nome - e até se vira contra o militante político que resistiu a esses tempos obscuros.
Mas...
... Mas gosto que sobrevivam pessoas sem papas na língua, que digam o que pensam, que provoquem reacção, que evitem os paninhos quentes de que vive, quase sempre, o regime e quem a ele se cola. Precisamos de quem abane consciências sem ser à força de petardos. Precisamos de quem se manifeste sem que disso precise para viver. Precisamos de vozes livres, venham de onde vierem.
É também por isto que gosto de Mário Soares, mesmo com os dislates ocasionais. Ou de Adriano Moreira. Que não dispenso Vasco Pulido Valente, ou Miguel Sousa Tavares. E tenho saudades de Maria José Nogueira Pinto.
... Diz Matilde a Luís Bernardo, no meio de um fugaz encontro que se transforma, página a página, no sal que tempera o belíssimo «Equador», de Miguel Sousa Tavares, que finalmente leio, confirmando o que amigos insuspeitos me disseram: começa a ler-se e não apetece parar. É verdade. Mas foi nesta frase que fiquei a pensar a páginas tantas: «Os que não morrem, encontram-se». Neste domingo em que a Lua tarda em aparecer no horizonte do meu telheiro, deixo-me ir atrás desta ideia de destino sem fatalidade que, volta não volta, regressa à minha vida. As coisas não são o que têm de ser, são o que delas quisermos fazer. Enquanto estamos vivos só nos resta acreditar que nos encontramos, que podemos transformar as nossas vidas, e que tudo depende só de nós e da nossa vontade. Descansamos vezes demais no conformismo de um fatalismo preguiçoso, e hoje apetece-me fechar a noite a pensar, a acreditar, que os que não morrem se encontram – isto é, que tudo está em aberto enquanto estamos vivos. Quem fecha portas e abre janelas, na minha vida, sou eu. Pode não ser verdade, pode não ser sempre verdade, mas hoje quero acreditar que é só esta a verdade que interessa.
(De vez em quando, coisas antigas. Esta tem cinco anos, está no "Fumo" de 2007. E continua a fazer sentido...)
Foi amizade à primeira vista. Quando conheci o chef Ljubomir Stanisic, há um ano e meio, numa conversa na rádio, percebi imediatamente que por trás daquela aparente rudeza estava um homem bom. E está. Com uma fortíssima história de vida, com talento a rodos, e com uma determinação invencível. Um homem de garra. Convido-vos a ouvi-lo um bocadinho...
Sentes que a guerra te traumatizou?
- Não, sinto-me bem aproveitado, a guerra fez-me bem.
Não percebo como...
- É claro que bateu mal quando era miúdo, mas depois decidi aproveitar o mal para o bem, e tirar partido do que vivi. A guerra fez-me mais forte, duro, fez-me ser como sou. Ensinou-me a defender os meus direitos, a não ter papas na língua, a dizer sempre tudo o que tenho para dizer. Podia ter ficado um “coitado”, a lamentar-me da guerra, mas não... Aquilo aconteceu, tenho saudades de algumas coisas da Jugoslávia, tenho saudades da minha irmã, da aguardente Rakia, dos bons queijos...
O que te mudou foi a guerra ou o confronto com a morte numa idade adolescente?
- A guerra não faz bem a ninguém, claro, mas aquela circunstância toda obrigou-me a ser homem mais rapidamente. Como não tinha pai, tive de ser responsável pela família.
Trabalhavas?
- Aos 15 anos já trabalhava, sim. Trabalhava numa padaria e estudava ao mesmo tempo, quinze horas por dia, dormia pouco, era duro como o caraças! Sustentava a minha irmã e a mãe, tinha ainda uma prima refugiada, estudava de dia, trabalhava de noite. Sabes, andei a afastar as memórias da Jugoslávia durante muito tempo, não queria pensar nisso, evitava, hoje não me lembro de muita coisa, quis e consegui afastar da memória as coisas más...
O resto desta história está na Playboy deste mês. Já saiu, e o facto de ter mulheres lindas não interessa mesmo nada...
Gostei muito de a fazer com o Paulo Barata Corrêa. A entrevista foi comprada ao Der Spiegel, e nela o arquitecto contava que, dois dias antes do 11 de Setembro de 2001, estava a almoçar com amigos e disse:
"Só acredito no imprevisível. De nada adianta estar a discutir politica. O imprevisto governa o mundo".
Dois dias depois, as torres cairam. Isso: "O importante é a vida".
Nem há quinze dias a revista Exame revelou, no seu ranking anual, que o Grupo EDP tem 3 das 5 maiores empresas portuguesas, sendo que a “EDP – Serviço Universal” (a que nos leva luz a casa) é mesmo a segunda maior, atrás da Galp.
Foi nisto que pensei ontem quando quis recuperar dinheiro perdido em estimativas excessivas e me dirigi à loja EDP do Marquês de Pombal. Como a primeira imagem demonstra, a EDP não pára e está a remodelar a sua loja-mãe. Um sinal da sua dimensão e dinâmica.
Dado que a dimensão determina a eficácia, não quis a EDP privar os seus clientes de um cómodo e eficaz serviço de atendimento. Para isso (reparem na imagem 2), abriu um espaço alternativo, em pleno Marquês, maior do que a Ginjinha do Rossio, porém mais pequeno do que a Rua da Betesga.
Sem espaço para sequer acolher os clientes, a EDP alimenta uma fila pela rua fora, que vai entrando lentamente para um balcão onde dois funcionários – repito, dois funcionários... – perguntam “A seguir? O que pretende?”.
Quando chegou a minha vez, e pensando na modernidade de todo aquele aparato – não sei porquê, lembrei-me dos velhos TLP e dos seus telefones fixos com listas de espera de três a seis meses... -, exclamei um sonoro “acho isto inacreditável!”. O zeloso e sorridente funcionário respondeu-me: “Estou totalmente de acordo consigo, também acho isto inacreditável!”. Fiquei estupefacto.
Sem mais demoras, mostrei-lhe o crédito que tinha a receber. Ele sorriu e acrescentou: “Para mais, isso nem é aqui. Tem que ir ali a uma papelaria de vão de escada, que é Agente EDP, onde lhe fazem o crédito...”.
Ainda zonzo com este pesadelo em pleno dia, que me fez perder hora e meia de um dia util, lá fui a uma papelaria junto à Duque de Loulé onde, entre totolotos e revistas, um homem me deu um monte de notas de 10 e de 20, que eu conferia enquanto atrás de mim se formava uma pequena fila de pessoas que queriam pastilhas, euromilhões, ou créditos da EDP.
Senti-me num país de terceiro mundo (onde, por sinal, nunca tive que receber créditos da conta da luz), e quando voltei à praça e olhei os modernos logótipos da EDP, e pensei na sua Fundação, na modernidade que ostenta, e no seu Presidente, dei comigo a rir sozinho. Umas horas mais tarde, em casa, leio no site da empresa: "Na EDP, a área de Investigação, Desenvolvimento e Inovação está alinhada com os seus pilares estratégicos". Bem me parecia.
Como é que nos espantamos com o estado em que estamos?
Quatro polaroids do ano da graça de 1999, mês de Novembro, que registam um momento: o da assinatura do primeiro contrato de edição da então nova editora Oficina do Livro com o primeiro autor da casa para o seu livro de estreia.
Tudo em primeiro, portanto: “Noites em Branco”, o meu primeiro livro, a primeira edição da Oficina do Livro, o primeiro contrato.
Que bom vê-la nesta conversa com a Cristina Esteves e senti-la bem viva, voltar a ouvir essa gargalhada cheia e boa, e saber que não pára. Ainda há dias lhe disse isto mesmo – com mais um livro, mais um passo, mais um dado na paisagem.
A Helena é um exemplo de resistência, inteligência, saber e sensibilidade. Mesmo para quem, como eu, não é católico, ouvir dizer que “os filhos são um empréstimo de Deus” não deixa de me deixar a pensar. A Helena tem tido esse papel na minha existência: quase sempre me deixa a pensar. Não é bom?
Gisela João O doce blog da fadista Gisela João. Além do grafismo simples e claro, bem mais do que apenas uma página promocional sobre a artista. Um pouco mais de futuro neste universo.
Uma boa frase
Opinião Público"Aquilo de que a democracia mais precisa são coisas que cada vez mais escasseiam: tempo, espaço, solidão produtiva, estudo, saber, silêncio, esforço, noção da privacidade e coragem." Pacheco Pereira
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