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Pedro Rolo Duarte

31
Out13

No comboio ascendente

 

Há anos que não vinha ao Porto de comboio. Boa razão aqui me traz (e a partir de agora, com regularidade): um saboroso regresso à RTP-2. Da novidade darei conta logo que haja certezas de datas e horas e esses pormenores.

Para agora, interessa apenas o prazer de uma viagem de comboio. Parece que se juntam memórias vivas e bocados de romances lidos, filmes vistos, canções ouvidas. Não deve ser por acaso que há tantas cenas deslumbrantes de filmes passadas em estações de comboios, em carruagens, em viagens.

(Claro que sei que o romantismo se esvai na rotina, no tempo perdido, na banalização. Mas, por agora, gozo a excepção do começo.)

Viajo para o Norte ao anoitecer e revejo, à saída na estação de Gaia, junto a carruagens velhas cheias de toros de madeira, a imagem de Diane Keaton e Warren Beatty abraçados, junto ao comboio que os separará, nos “Dez Dias que Abalaram o Mundo”, um dos clássicos (livro e filme) do final da minha adolescência. A referência não faz qualquer sentido nem tem lógica - mas a viagem e aquele cheiro a madeira levou-me tão longe quanto isto…

A cabeça de uma pessoa também é esta mistura desordenada de bocados de vida. Vivida. Por viver. Vivida através da ficção. Ou apenas sonhada.

25
Out13

18 anos (versão Lux Woman)

(Crónica originalmente publicada na Lux Woman. A edição de Novembro saiu ontem e está mesmo boa. Palavra de jornalista!)

 

O meu filho vai fazer em Outubro 18 anos. Atinge a palavra mais desejada na juventude: maioridade. Pode votar, pode decidir por si da sua vida, pode dizer-me que não. Achei sempre que este momento marcaria um “antes” e um “depois” na vida dos pais e na nossa relação com ele, mas o António Maria encarregou-se de antecipar tudo ao decidir, com 16 anos, e o apoio do pai e da mãe, viver fora de Portugal.

Talvez esta entrada nos 18 seja apenas uma formalidade – mas sinto-a como bem mais do que uma data e uma alteração legal. Sinto-a como um momento determinante da vida e relação deste trio que se forma, apesar do divórcio dos pais, entre nós e o filho.

Talvez por isso, decidi enviar-lhe daqui para a Austrália, onde ele está, uma carta de recomendações para esta entrada na maioridade. O que lhe disse? Bom, que aos 18 anos o mundo é maior do que sabemos, mas mais pequeno do que desejamos. Felizmente, ele já conseguiu perceber quão grande ele é, e como somos pequenos e insignificantes neste espaço imenso. Como tudo indica que só vivemos uma vez, sugeri-lhe que aproveitasse o melhor do mundo e saboreasse cada dia como se fosse o ultimo. Não é, mas muitas vezes parece.

A maioridade não é de todo a maturidade. A maioridade é apenas uma forma de dizer: “rapaz, começa a crescer porque em breve só te sustentas a ti próprio…”. Entre uma palavra e outra, cometem-se toda a espécie de erros e asneiras que permitem, daqui a muitos anos, distinguir a idade da tal maturidade (se é que existe, não tenho a certeza). Será tarde, mas muito a tempo de uma velhice tranquila…

Para ele, a vida começa realmente agora. Escrevi-lhe: “Se olhares com atenção, há tanto por fazer que parece faltar-nos ar e vida para tudo. Sugere o teu pai: faz pouco, mas faz bem. Um passo de cada vez. Acredita que a revolução socialista foi um erro tremendo da humanidade, mas havia um daqueles pensadores (Lenine, salvo erro…), que teve um momento feliz quando quis definir a forma de avançar: dois passos em frente, um atrás. Ganha-se sempre um passo”.

Ao mesmo tempo, e sem querer ser paradoxal, falei-lhe do bocadinho de loucura que faz da vida algo com sal e pimenta: ousar e arriscar. Não ter medo – este é o momento em que o medo não faz sentido – e ter a capacidade de fazer do impossível, o possível. Na infância e na velhice, o medo é intrínseco e certo, deixemo-los no seu tempo próprio.

De passagem, recordei-lhe um ensinamento que vem da adolescência: “não te leves demasiado a sério, tem a capacidade de rir de ti próprio”.

Por fim, desafiei-o a decidir a que país quer pertencer. Sobre isso, escreveu-me há um ano: “Eu não desisti de Portugal. Nem nunca tal acontecerá. Sei que pode ser difícil perceber, visto que pareço ser um miúdo de 16 anos que tudo o que quer é sair do seu país e ir fazer surf e curtir para a Austrália. Mas não é bem assim. Ser português é a maior honra que pode existir a seguir a ser teu filho. Deste país, ninguém devia desistir”. Pois bem: aos 18 anos, olhar Portugal à distancia e saber que se quer continuar português é mais ou menos como dizer “eu não vou deixar de sonhar”.

O melhor que posso dizer ao meu filho, agora que chega a essa idade mítica, é apenas isso: que não deixe de sonhar, mesmo quando olha Portugal e vê pesadelo. Que não deixe de acreditar, mesmo que o débito seja maior que o crédito. E que acredite que o pai está aqui para apoiar os sonhos, amparar os acordares mais duros, e de vez em quando confrontá-lo com a realidade. Às vezes dói, mas a dor começa no parto e nunca mais acaba.

O resto, é o amor que todos os pais têm pelos seus filhos. E eu pelo meu. Aos 18, como desde sempre. E para sempre.

20
Out13

Um momento com José Sócrates

A entrevista de José Sócrates a Clara Ferreira Alves é um documento exemplar no que ao jornalismo e à politica dizem respeito. Para o jornalismo, é um trabalho de excepção – independente sem ser neutro, empenhado sem ser militante, claro sem ser simplório. Clara Ferreira Alves no seu melhor.

Do ponto de vista politico, e para lá do conteúdo, revela a hipocrisia da politica no seu melhor: o mesmo homem cuja linguagem era enquadrada pela condição institucional, não deixa de soltar a franga quando se sente livre desses empecilhos “menores”.

Na verdade, ao reconhecer aquela linguagem – onde o calão ganha lugar de destaque -, lembrei-me de um episódio que vivi com José Sócrates e que definiu para todo o sempre o meu olhar sobre aquele homem. Passou-se a meio dos anos 90 (como corrige e bem um leitor, em 1993), dois anos antes de Guterres ganhar as suas primeiras eleições. Quis o destino que uma amiga comum a mim e a Sócrates concorresse a uma das principais camaras do país. Dado que um canal de TV (nova correcção do leitor: terá sido a RTP ou a SIC...) decidira fazer alguns debates entre candidatos, e a nossa amiga era uma das escolhidas, pediu a ambos que a ajudassem a preparar esses debates. Na qualidade de amigos da candidata, fizemo-los com gosto e conhecemo-nos. José Sócrates era deputado. Tratávamo-nos por tu, chegámos a jantar uma vez no velho Petit de Algés. Falávamos de politica mas também da vida de cada um – e depois lá íamos ajudar a nossa amiga a ganhar a sua camara. E ganhou mesmo.

Dois anos depois desses encontros, Guterres vencia as eleições e José Sócrates era nomeado secretário de estado do ambiente. No aniversário da nossa amiga comum, em pleno clima de vitória socialista, vi-me numa festa onde se confundia a comemoração da aniversariante com o regresso do PS ao poder. À medida que “progredia” no espaço onde a festa decorria, fui cumprimentando as pessoas que conhecia. Algumas tinham sido entretanto transformadas em ministros, o próprio António Guterres estava presente já como primeiro-ministro (por empossar, salvo erro). Falei a todos os que conhecia como falava antes da vitória socialista – e assim me falaram todos também, por tu ou por você, com maior ou menor formalidade, conforme o grau de intimidade.

Por fim, encontrei José Sócrates, que ainda uns tempos antes me tratava por tu. Ao ver-me, o (agora) secretário de estado mostrou alguma surpresa e disse:

- Olá, como está? Você, por aqui?

Senti um frio na espinha e a mais terrível sensação de incómodo. O tu tinha dado lugar ao você, e a proximidade substituída pela indiferente distância. Para mim, nesse dia, percebi quem era José Sócrates.

Lembrei-me desses tempos quando li o Expresso e o vi livre e de língua solta. Será que, se o encontrar na rua um dia destes, me volta a tratar por tu?

18
Out13

Contagem absolutamente pessoal (IV e ultima)...

 

Tenho um filho maior de idade.

Maior nas alegrias que me deu - e à sua mãe, claro - em opções tão diferentes quanto o Benfica ou a leitura, a Austrália ou o gosto pelo cinema, o interesse pela politica ou a ligeireza com que viaja pelo Mundo.

Tenho um filho que faz hoje 18 anos. Nasceu na madrugada deste 18 de Outubro, mais ou menos a esta hora, e estando longe, sinto-o perto.

Daqui a um mês estará por cá. Agora, como há 18 anos, é a água, o mar, o que nos aproxima e nos afasta. Mas é também uma paixão comum. Por isso escolhi esta foto, que tem quase 18 anos...

Tenho um filho maior de idade. Mas maior do que a idade dele, é o orgulho com que o vejo crescer e ser melhor do que eu fui. Pode um pai querer mais do que isso?

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Gisela João O doce blog da fadista Gisela João. Além do grafismo simples e claro, bem mais do que apenas uma página promocional sobre a artista. Um pouco mais de futuro neste universo.

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