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... Por isso, depois da vitória de António Costa no PS (e ainda que ache melhor, para os socialistas, esta saída airosa, do que a manutenção do inepto e inseguro Seguro), adopto a máxima que definiu na perfeição o comentário desportivo:
"Prognósticos? Só no fim do jogo."
Falamos daqui a um ano, mais coisa menos coisa.
… Mas eu continuo sem perceber por que motivo Pedro Passos Coelho requereu o subsidio de reintegração reservado aos deputados em exclusividade - quando, pelos vistos, nunca teve formalmente esse estatuto, nem foi como tal remunerado.
E também não sei o que fazia, em concreto, o Centro Português de Cooperação, de que foi presidente Pedro Passos Coelho, e menos ainda por que raio este centro estava ligado a uma empresa, Tecnoforma, que se dedicava à formação profissional para as autarquias (já agora, que tipo de formação? Com que formadores?). Um pouco como uma fábrica de sapatos criar uma empresa dedicada à edição de livros…
Não entendo como é que Passos Coelho foi consultor da empresa para essas acções de formação, que viviam de fundos europeus, mas acabou a administrar um Centro de Cooperação focado em África.
Escapa-me que a essa ONG estivessem ligados, segundo o “Público”, nomes como Marques Mendes, Ângelo Correia e Vasco Rato - e que alguns não se lembrem disso, e mesmo os que admitem lembrar-se não dizem uma palavra sobre a efectiva actividade da Organização. A memória, no PSD, anda definitivamente a precisar do elefante do Memofante. A foto que junto fui buscar aqui.
Estranho que os jornais ainda não tenham explicado - ou se calhar percebido - o que fazia de facto a Tecnoforma, que acções de formação desenvolveu, quem as orientou, que resultados obtiveram. E o mesmo em relação ao Centro Português de Cooperação: com quem cooperou? De que forma? Com que dinheiro? Que acções efectivas reclama para si?
Confesso: o dossier Passos Coelho interessa-me mais pelo que pode revelar sobre empresas e ONG’s de perfil opaco e actividade duvidosa, do que pelos dinheiros que o senhor recebeu ou não (embora, por essa via, consigamos perceber de que matéria é feita o homem que nos asfixia com impostos e prega a frugalidade como se fosse uma religião). Mas cheira-me que, se não for o empenho militante na verdade de jornalistas como José António Cerejo e Paulo Pena, a coisa morre na praia. E a vida continuará aqui no pântano.
(Crónica originalmente publicada na Lux Woman. A edição deste mês chegou esta semana quentinha às bancas...)
Um dos meus passatempos favoritos é vaguear por livrarias, de livro em livro, sem objectivo, e tantas vezes sem gastar um cêntimo. Lisboeta que sou, faço-o na minha cidade. Na Bertrand do Chiado, porque é grande e tem salas consecutivas, tematicamente organizadas; na Barata da Avenida de Roma, por ser o meu espaço de eleição quase desde a infância; na Ler Devagar, da Lx-Factory, pelo puro prazer de pairar entre livros de hoje e edições antigas, esgotadas, distantes. Como se tivesse a Feira do Livro à disposição todo o ano…
Quando se soube que Alice Munro vencera Nobel da Literatura, foi na Ler Devagar que encontrei os seus livros - e fui logo à procura, porque gosto de contos e estou farto de ouvir os editores portugueses dizerem que “livros de contos não vendem”.
Detesto lugares-comuns e ideias preconcebidas sobre livros. O que vende e o que não vende. O “que dá” e o que “não dá”. Se os nossos editores mandassem no mundo, Harry Potter não tinha visto a luz do dia…
E foi por entre estes pensamentos banais que dei comigo com esta pergunta convocada pelos momentos livres em livrarias: por que raio são só elas a escrever sobre nós?
Basta passar os 40 anos - algumas mais precoces arriscam aos 30… -, e não há quem não tenha uma teoria, uma receita, uma solução, uma análise, ou apenas uma história para contar sobre os “homens com 40 anos”.
São infiéis. São homossexuais mas ainda não saíram do armário. Deviam ter pêlos mas agora decidiram não ter pêlos. Não têm pêlos mas deviam ter. São sensíveis mas há saudades de uma boa palmada no rabo. São machistas e por isso insuportáveis.
Leio blogues, acompanho redes sociais, leio revistas e até livros de quem não teve vergonha na cara, e percebo que os temas que mexem com as relações deixaram de estar no recato do lar e chegaram de vez à praça da ribeira.
Felizmente já tenho 50 - mas calculo que ter 40 anos nos dias de hoje deva ser um caos e uma tortura: tem de se ser másculo mas sensível, sem pêlos mas com barba, ginasticado mas nem sempre musculado. E o pior não é isso - o pior é que somos todos, mais velhos e mais novos, uns cobardolas, não nos chegamos à frente e não dizemos realmente o que pensamos e sentimos.
Sofremos com as exigências, as queixas, a mania absurda da saúde, e ainda temos de levar com pessoas, como uma das minhas amigas mais expansivas, numa vaga desconfiança de que todos os homens são gays.
Neste quadro, as minhas “viagens na maionese” das livrarias têm também uma componente de estudo sociológico. O que interessa a quem compra? Que critério para esta capa, este titulo, esta chamada?
E o que vejo?
Vejo que as mulheres persistem em escrever sobre nós - OS HOMENS! -, as relações, as recomendações (e até as dietas…), os fetiches das barbas mal amanhadas. Vejo uma maioria de livros cujo titulo é em si a mensagem: “o amor pode dar certo”; “Amar até ao infinito é possível”; “Como descobrir a paixão num empregado do café da sua esquina”.
E o que não vejo?
Livros equivalentes para homens. Não vejo os tipos da minha idade a escrever sobre o que obviamente também têm a dizer. Podem ser pêlos ou operações plásticas - mas também pode ser sobre a capacidade de rir de nós próprios ou a simples evidência de cada um ter os seus inconfessaveis fetiches que-algum-dia-vamos-ter-de-contar. É o deserto que tenho pela frente: nem um livrinho decente (ou indecente…) sobre “isto” de ser homem.
Aqui chegado, falta-me o remate de crónica. Na verdade, não falta - esse remate só existirá quando um de nós se chegar à frente e escrever um livro sobre relações aos 30, aos 40, aos 50, sobre relações onde somos de novo filhos, ou de novo pais, ou de novo qualquer coisa que não imaginaríamos ser. A ver pelas edições, só há novas mães, novas amantes, novas mulheres.
Nós, népia. Não existimos. Não contamos para o campeonato. Não riscamos. O pior é que, às tantas, é verdade. Vou pensar melhor.
O nome dele é Paulo Neves da Silva. Uma vez entrevistei-o na rádio, por causa do seu “Citador”. Surpreendeu-me o confronto entre o facto de ser um informático ligado à criação de software e a paixão pelas ideias - paixão que o levou a criar um “fenómeno” chamado Citador, uma base de dados monumental de aforismos, citações, poemas, ideias, que constitui um verdadeiro serviço público na net.
Este Paulo, que conheci entre microfones, revelou-se um homem simples, modesto, que juntou a paixão pelas palavras ao saber informático, e fez dessa coligação um hobbie que viria a ser também um pequeno negócio: do Citador já nasceram vários livros de aforismos organizados segundo temas e/ou autores. Agora, saiu mais um desses seus volumes, desta vez dedicado ao “meu” Vergílio Ferreira, 250 páginas de “máximas e reflexões”. Fica esta, a propósito do momento que vivemos:
“O grande sinal do nosso tempo é a morte da memória”.
E é. Mas uma citação puxa outra:
“O tempo que passa não passa depressa. O que passa depressa é o tempo que passou”.
Outra vez: e é.
Ontem, Lisboa paralisou com a tempestade inesperada e as consequências do costume: lagos, rios, inundações e bombeiros. Nada que não vejamos regularmente nas noticias vindas de países civilizados, e até mesmo habituados à chuva, como o Reino Unido ou a França.
Mas naquele jogo da “apanhada” que o PS decidiu tristemente exibir, a tragédia (sim, muita gente teve prejuízos elevados, não é coisa para se brincar, digo eu…) foi transformada em arma de arremesso por António José Seguro, que declarou que o país exige um primeiro-ministro para todas as estações e não apenas para quando há bom tempo…
Ironizou com a desgraça alheia, brincou com uma imprevisibilidade da natureza, e até revelou ignorância: desde que foi reestruturada a organização administrativa da cidade de Lisboa, passou para as Juntas de Freguesia a competência da limpeza e manutenção das sarjetas e sumidouros, bem como das vias publicas…
Ora, se Seguro quer vir a ser primeiro-ministro não pode falhar três itens essenciais: ter postura de estado quando há calamidades, não brincar com a miséria alheia, e não revelar ignorância em matérias essenciais. Conseguiu fazer o pleno da asneira. António Costa não alinhou na brincadeira, mas não ficou melhor na fotografia: enquanto Lisboa submergia, manteve-se paulatinamente em Coimbra, fazendo campanha. Estão ou não estão a brincar com isto tudo?
Está no Ípsilon de ontem. Fotografei assim e gostei da ondulação da imagem, por isso não corrigi. Mas na verdade convocou-me um poema de José Gomes Ferreira que marcou a minha juventude.
Não consigo ver agora, como então via, as virtudes da “reforma agrária” que inspiraram o poeta (pelo contrário, sei quão adiado foi o Alentejo por causa desses anos de brasa) - mas na medida em que me sinto, depois de lisboeta, alentejano, recupero um bocado desse poema. Este:
“Nunca vi um alentejano a cantar sozinho
com egoísmo de fonte.
Quando sente voos na garganta,
desce ao caminho
da solidão do seu monte,
e canta
em coro com a família do vizinho”.
E é verdade.
Nos países onde a democracia é civilizada e levada a sério, erros como aqueles agora registados no processo de colocação dos professores, que fez do inicio do ano escolar um caos generalizado (não foi a primeira vez, mas terá sido dos piores anos, e sem qualquer justificação válida), levariam obviamente à demissão do ministro Nuno Crato.
Mas Portugal é um país “diferente”, onde a responsabilidade política é uma figura de retórica usada apenas em campanhas eleitorais. Resultado: “lixou-se o mexilhão”.
Demitiu-se Mário Pereira, director da Administração Escolar, sem duvida um dos responsáveis pela loucura que vai por essas escolas. Mas ficou de pé, sem pinga de vergonha na cara, Nuno Crato, o efectivo responsável político - ou seja, público - pela balbúrdia. "Apresentamos as nossas desculpas aos pais, aos professores e ao país", disse o ministro. Faltou-lhe acrescentar ética e seriedade ao discurso: “e nessa medida, obviamente, demito-me”.
Isso seria outro Portugal. Aquele que nunca mais chega à maturidade, à responsabilidade, ao exemplo que faz a diferença.
(Nestes momentos lembro-me sempre de Jorge Coelho, que tinha má fama mas teve boa prática: demitiu-se de ministro do Equipamento Social na sequência do acidente na ponte de Entre-os-Rios. António Guterres, então primeiro-ministro, sublinhou a «dignidade de quem seguramente está isento de qualquer responsabilidade pessoal pelos trágicos acontecimentos». Mas aceitou a demissão. Há exemplos que vale a pena lembrar, para que não se julgue que “eles são todos iguais”. Há uns mais iguais do que outros. Confesso: tenho saudades de políticos como António Guterres.)
Noticia de jornal: “Os bilhetes para os quatro concertos de Martina Stoessel – a Violetta da Disney, que actua no Pavilhão Meo Arena, em 2015 –, devem esgotar este domingo. Em pré-venda, ‘voaram’ 24 mil entradas no sábado”. Perguntará o incauto: e quem é a Violetta?
Só quem tem filhos abaixo dos 10 anos sabe responder com propriedade, mas dada a minha convivência com algumas crianças dessas idades, posso adiantar: é a protagonista de uma série que passa apenas no canal Disney e se chama justamente Violetta. A rapariga tem 17 anos, é argentina, actriz e cantora. A televisão mostrou as filas para comprar bilhetes e a histeria que se apoderou da miudagem quando se soube que vinha a Portugal.
Até aqui nada de novo, é mais um daqueles fenómenos de popularidade que as crianças cultivam com esmero e dedicação até ao dia em que cruelmente trocam essa obsessão por outra, e esquecem em minutos o que parecia ser um amor para a vida…
O que é novo (ou melhor, mais sólido do que nunca, dado que já tínhamos visto um caso semelhante com a série Hannah Montana, que lançou para a estratosfera Miley Cyrus) é o facto de se confirmar por esta via o fim do poder hegemónico dos canais de televisão generalistas sobre as massas populares.
Ou seja: não foi a RTP nem a SIC nem a TVI a criarem e tornarem monumental a figura de Violetta - foi um canal de cabo, para mais um canal temático, infanto-juvenil. Certamente articulado com redes sociais e outras plataformas, a Disney consegue criar um fenómeno de moda que nos habituámos desde sempre a estar reservado apenas aos generalistas. É o fim de um tempo, é mais um paradigma que muda, mais um dado adquirido que desaparece.
Os media vivem a maior revolução desde que Gutenberg inventou o que viria a ser a tipografia. Ao contrário do que sucedeu com o aparecimento da rádio ou da TV, o que está hoje em causa não é o meio - é o modelo de negócio em si, é a maneira de comunicar, são os canais e as plataformas de comunicação. No século XX evoluímos da impressão em papel e da telegrafia até à rádio, à televisão, ao cinema, ao video. Criámos uma industria e uma forma de ganhar dinheiro com ela. No começo deste século XXI, todo esse mundo desapareceu e estamos de facto a inventar de novo a roda. Mesmo sem saber como roda e para que lado vai rodar.
É tão fascinante quanto imprevisível. Ou talvez seja fascinante por causa disso mesmo.
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