E pronto: volta mais uma semana de TPC - Tanto para Conversar -, comigo de segunda a sexta, depois das 23:30, na RTP2 (e depois, na net, em RTP-Play). Desta vez são programas inéditos… A saber: Amanhã, segunda-feira: Ricardo Araújo Pereira. Terça-feira: Cláudia Clemente Quarta-feira: Nuno Costa Santos Quinta-feira: Jamila Madeira Sexta-feira: José Luis Peixoto. E é isto.
Ía começar a reler os “Contos”, de Vergílio Ferreira. Então apanhei este primeiro parágrafo do primeiro conto (“Adeus”), e fiquei ali, preso ao génio e à perfeição. Às palavras todas ditas sem falta nem excesso. Vejam só:
“Não lhe pedi que viesse. Pedi-lhe só que às dez da noite, e pela última vez, a sua lembrança me esperasse ao caminho. Cheguei cedo e sentei-me. Quando soasse a hora, eu queria senti-la ao pé de mim, não bem no seu corpo, não bem nas suas palavras, mas apenas naquele sossego azul que tornava o mundo perfeito. No momento combinado, eu havia de respirar o sonho de quando não sabia que era sonho”.
"Sossego azul"? Depois de ler isto, dei por encerrada a noite de leitura. Não faltava já nada.
Ontem entrei nos terrenos que foram, na minha infância e juventude, a Feira Popular (local de romagem obrigatória no ultimo dia de aulas do Liceu, todos os anos…), e onde agora, durante esta época natalícia, se montou um improvisado mini parque de diversões, atamancado num chão degradado e até perigoso, pouco asseado e demasiado barulhento. Bom, os putos divertem-se, e isso é que interessa. Porém, olhando aquele vasto terreno em pleno centro da cidade de Lisboa, e face às notícias de que a Camara de Lisboa tenciona vender aquilo tudo no decorrer do próximo ano (está inscrito no Orçamento da CML), não consegui deixar de pensar em todos os grandes negócios que foram feitos nos últimos anos entre Estado e privados, como não consegui que o meu pensamento fugisse do Estabelecimento Prisional de Évora, como derrapei no BES, e acabei meio zonzo com a imagem de Isaltino… Resumindo: temo o pior. Não sei se não prefiro aquilo assim, intocado, mesmo que abandonado. Ou transformado em jardim publico. Qualquer coisa menos negócios que daqui a uns anos vão dar noticias de jornal. Más notícias.
(Chegámos a este ponto: o medo de abrir mais um capitulo de miséria e crime leva-nos a admitir que é melhor ficar quieto. Não fazer. Não mexer. Não avançar. Há pior sintoma?)
O “Expresso” anda a oferecer uma excelente colecção de grandes entrevistas "da História" com as mais carismáticas e relevantes figuras (para o bem e para o mal, bem entendido, e incluindo algumas portuguesas). Já tinha comprado uma vez um livro bem grosso com as “Grandes Entrevistas do Século XX”, publicado pelas edições El Pais, em espanhol, mas não coincidem com estas. São outras boas entrevistas. Estas, leio-as escolhendo as figuras que me interessam. E ontem à noite, lendo a de Steve Jobs, o homem da Apple que infelizmente nos deixou há 3 anos, depois de uma luta acesa com o cancro, sublinhei esta ideia. Que partilho, com respeito e admiração, mas também porque a acho inspiradora para as nossas vidas, qualquer que seja a idade que tenhamos, ou a condição em que estejamos: “Quase tudo - todas as expectativas externas, todo o orgulho, todo o receio da vergonha e do fracasso - , todas estas coisas simplesmente desaparecem ao enfrentar a morte, deixando apenas o que é verdadeiramente importante. Lembrarmo-nos de que vamos morrer é a melhor forma que conheço de evitarmos o engano de acharmos que temos algo a perder”.
No Facebook, seria "like". Aqui, é a citação e a memória de um homem genial. Coberto de razão.
Fiz parte da equipa de fundadores do jornal “i”. Coube-me (e estarei sempre agradecido ao Martim, ao Francisco e ao André) a edição da revista que, durante o primeiro ano do jornal, animou a sua edição de fim-de-semana. Como a revista era quase um outsourcing, eu ía à redacção dois dias por semana, para fechar a edição. Tinha uma mesa num dos cantos da fila de lugares da secção Mais, onde se multiplicavam jornalistas com menos de 30 anos. Ou 25. Havia uma excepção: o Mendes Nunes. E outra: a secretária da revista. E mais uma: eu. Como não conhecia ninguém, divertia-me a tentar adivinhar quem seriam os rostos dos nomes que lia no jornal. Acertei alguns, falhei a maioria. Mas a maior surpresa foi mesmo uma miúda muito bonita, sempre de sorriso aberto, porém tímida, discreta, que dado este quadro que vos descrevo não podia de todo ser a jornalista de mão cheia que assinava matérias óptimas, bem escritas, ousadas, inteligentes, com sentido de humor, sob o nome Joana Stichini Vilela. Um dia, descobri que era mesmo ela. Um talento enorme, uma modéstia que só lhe ficava bem, e o tal sorriso aberto com um olhar que tanto parecia ser discreto, como podia ser irónico. Nunca cheguei a conclusões sobre esta parte. Mas isso agora interessa pouco: a Joana, há dois anos, lançou um livro, LX-60, que materializava uma excelente ideia - desenhar um quadro da Lisboa da década de 60 através das suas histórias, personagens, ruas, edifícios, num meticuloso trabalho de edição jornalística, design e imagem. Juntou-se ao homem que desenhou o “i” (Nick Mrozowski, que entretanto voltou aos EUA), e ao que depois o continuou, Pedro Fernandes, geriu uma pequena equipa, e editou um coffee table book de excelência. Estava-se mesmo a ver que a coisa era apenas o começo. Ontem, na deslumbrante loja da Catarina Portas no Largo do Intendente, apresentou-se a “sequela” da ideia: LX-70, a década (como bem definiu Nuno Artur Silva) “partida ao meio, e que mudou tudo em Portugal”. O livro é outra vez um aprumo de boas ideias, melhores histórias, design, imagem e conceito. Com humor, ironia, mas também com rigor e investigação, reúne e constrói um quadro da década de 70 que toca a todos os que a viveram. Nasci em 1964, o que só me dá direito a meia década de 70. Mas o que lá está, está mesmo. E ontem, ao ver a Joana, tímida como a conheci, mas nem por isso menos assertiva e divertida, a falar sobre este novo livro, não consegui deixar de me recordar da mesma Joana das mesas corridas do “i”. Uma jornalista do novo tempo, que sabe que as palavras não vivem sem imagens, ideias, conceitos, design e, por fim, sal e pimenta. O livro merece o dinheiro que custa. E agora fico à espera do LX-80.
Gisela João O doce blog da fadista Gisela João. Além do grafismo simples e claro, bem mais do que apenas uma página promocional sobre a artista. Um pouco mais de futuro neste universo.
Uma boa frase
Opinião Público"Aquilo de que a democracia mais precisa são coisas que cada vez mais escasseiam: tempo, espaço, solidão produtiva, estudo, saber, silêncio, esforço, noção da privacidade e coragem." Pacheco Pereira
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