Sim, a História repete-se
Andava num disco rigido externo à procura de um texto, que obviamente não encontrei (porque nunca fui um bom arquivador, como era o meu pai), mas por outro lado encontrei - entre fotografias e textos - muita coisa que não procurava. Entre esse espólio, estava um texto que me lembrou uma conversa recente. Foi publicado na revista Visão em Maio de 1995, ou seja, há mais de 20 anos. Parece assim tão fora de moda?
Ei-lo:
"Façam o favor de olhar à volta, vasculhar jornais e revistas, da economia à moda, dos assuntos gerais à política, do espectáculo ao desporto. O que é que encontram, o que constitui dossier, especial, capa, fotoreportagem? É uma nova moda, uma mania, quase um culto dos jornalistas: a memória. O calendário determinou que esta fosse uma época de recordações — e aí está a efeméride, que durante décadas serviu para tapar buracos em momentos de vazio imaginativo, a ganhar estatuto de estrela da imprensa e da televisão. Desde há um ano que não há semana, não há quase um dia, sem um dossier, um exclusivo, uma viagem ao passado, seja o mais recente — agora estamos no centro dos «festejos» do Verão quente de 75 — ou o mais antigo, como a 2ª Guerra Mundial. Mesmo quando o assunto é actual, a imprensa envelhece-o com um regresso rápido ao passado ou uma fotografia bem antiga (veja–se a excelente capa da revista «Exame» dedicada ao desemprego).
É um fenómeno novo, na medida em que transforma o passado em actualidade e dá–lhe um enquadramento estético ajustado, com a fotografia a preto e branco, a crónica de situação, a revelação de um dado ainda desconhecido. É uma necessidade da classe, que se confronta com uma agenda demasiado desinteressante para as fasquias em que coloca a venda e audiência. É um gosto que toca a todos — os mais velhos caiem no poço da nostalgia e os mais novos conhecem o estranho mundo em que os pais e os avós viveram. Não ofende ninguém. Pode, quando tratado com cuidado, trazer revelações surpreendentes.
A moda da memória é nova, reflecte–se na generalidade dos meios de comunicação e, como todas as modas, vai cansar quem a determina e quem a consome. Até lá, é um apoio fundamental para a falta de novidade."
E foi. E agora voltou. A vida é mais ou menos isto.