Um dia, há uns anos, fui a Fátima. Fui sozinho, por pura curiosidade, e fora destas datas mais simbólicas. Era um dia de semana e, ainda assim, estava muita gente no Santuário, empenhada e dedicada. Surpreendeu-me.
Mas o que mais me impressionou, além dos grupos de peregrinos e do comércio que os rodeia, confesso: foi esta placa, que encontrei espalhada por todo o lado. Não imaginei possível sequer que existisse. Menos ainda naquele lugar.
(Crónica de ontem na plataforma/newsletter Sapo 24)
Confesso a minha ignorância: até agora, não sonhava com os repentinamente famosos contratos de associação entre o Estado e os colégios privados. Eu, e seguramente uma boa parte dos portugueses, estávamos a leste de mais este “subsidio” que os nossos impostos vão pagando. A decisão do Governo de acabar com esses contratos, firmados com os colégios privados para suprir as faltas do ensino público em quase todas as regiões do país, abriu um debate que tem tanto de irónico quanto de revelador sobre o Estado, os partidos, e a nossa eterna subsidiodependência. Comecemos pelos partidos. É irónico, divertido - ainda que trágico - ver que aqueles que passam a vida a encher a boca com “menos estado, mais iniciativa privada”, sejam aqueles que estão contra o fim destes contratos - que mais não são do que “mais estado e menos privado”… Como foi o Governo de Passos Coelho que perpetuou esta embrulhada - pelos vistos, oferecendo um bom negócio aos colégios privados sem cuidar de avaliar os recursos públicos entretanto criados… -, vê-se agora na contingência de defender o que (vou fazer-me de ingénuo…) precipitadamente assinou. Ao contrário, o Governo socialista, acusado pela direita de ser despesista, gastador, e pôr em causa todo o trabalho de formiguinha feito pelo PSD e pelo CDS, é por estes arrasado no primeiro momento em que mostra alguma vontade de gerir recursos com parcimónia e inteligência… Parece que os papeis se invertem. Na verdade, o que se inverteu foi apenas o lugar de cada um no xadrez politico: os que estão fora do poder, podem agora gritar o que lhes apetece e parecerem meninos de coro a caminho da missa. Não é nada com eles. Pior: tinham a austeridade na ponta da espingarda até há uns meses, e agora descobrem que Portugal é tão rico que até os pais com menos recursos económicos podem optar por colocar os filhos em colégios privados, e caros… Há porém um ponto em que PSD e CDS têm razão. E é relevante. Por mais falha ou buraco negro que possa existir na legislação - e que permita ao Governo abreviar estes contratos -, eles foram assinados para três anos. E os colégios que os assinaram confiaram. Que o Estado não é pessoa de bem, há muito que sabemos. E disso somos responsáveis, nas escolhas que fazemos em cada eleição. Que um Governo dito socialista tenha a desfaçatez de mostrar à luz do dia que a palavra dita, assinada e reconhecida, não tem qualquer valor, sustentado num qualquer artigo da lei obscuro e desconhecido dos colégios, é um atentado à já escassa confiança que temos em tudo o que cheira a Estado. E se é verdade que o Estado somos todos nós, quem raio somos para deixar que chegue a este estado? Talvez devêssemos parar e pensar nisto. O que não vale é misturar uma medida certa - a do Governo - com o momento errado em que é aplicada, a dois anos do fim do contrato que foi assinado. Não se mudam regras a meio do jogo.
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