Nada como a História bem contada para nos devolver um Presente mais claro. Quatro minutos exemplares.
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(Ontem, quinta, na plataforma Sapo24)
Há duas formas de observar e analisar a tragédia que este Verão se abateu sobre Portugal: ou continuamos a converter qualquer acontecimento num argumento para a disputa política entre os Partidos que governam e que estão na oposição, e tudo continuará como está; ou abrimos os olhos e reconhecemos que há factos que estão bem para lá do imediatismo da politica de um Governo com dois anos de vida, ou de uma ministra claramente inepta para a função.
Prefiro o segundo caminho. Não consigo atribuir especificamente a este Governo, a António Costa, ou atè à Ministra Constança Urbano de Sousa, a responsabilidade final pelos mortos, feridos, terrenos queimados, casas e fábricas destruídas. Foi óbvia a demissão da ministra, como é óbvio exigir explicações sobre como se consegue repetir o mesmo erro em quatro meses. O Presidente da Republica foi exemplar na forma como, no seu discurso de terça-feira, colocou a questão, clara mas elegantemente. No entanto, por mais que queiramos responsáveis imediatos, todos os testemunhos credíveis de especialistas em matéria florestal, de protecção civil, de gestão de crise, vão desembocar numa mesma palavra: Portugal.
Portugal e os portugueses. O nosso eterno laxismo, a nossa doce negligência, a velha ideia de que “só acontece aos outros”, o crime sem castigo, a investigação judicial que morre solteira, e uma forma de vida que não contempla desvios à norma. Basta começar a fazer perguntas: como é possível um idoso de 91 anos, com dificuldades de locomoção, viver sozinho numa aldeia com 20 habitantes? Quem permite tamanho abandono? Como é possível as empresas de energia e telecomunicações agirem livremente na colocação de postes e cabos ao ar livre, quando até os prédios de Lisboa que são renovados criam sistemas de cablagem internos? Como é possível a descoordenação que leva a baixar as guardas da defesa da floresta quando as autoridades ligadas à meteorologia avisam que o calor vai continuar? Como há ainda casas, por esse país fora, onde as botijas de gás convivem com as paredes dos quartos ou das salas? Quem põe o pauzinho na engrenagem da investigação criminal? Como se permite que haja aldeias cercadas por combustível vegetal sem que Estado ou cidadãos cuidem de se proteger?
As perguntas não param, e todas reflectem uma mesma atitude, que não respeita apenas aos Governos e às autoridades: respeita a todos nós. Pouco cuidadosos, crentes numa infalibilidade que não existe, e sempre surpreendidos – seja pela tragédia, seja pelo milagre. Depois da surpresa vem a solidariedade, e depois da solidariedade vem o queixume: “o dinheiro nunca cá chegou, ficou pelo caminho”.
Está tudo por refazer em matéria de política florestal. Como bem recordou Miguel Sousa Tavares, há 30 anos que o Eng. Gonçalo Ribeiro Telles vem avisando para este facto. Há um Portugal por reconstruir, certo, e crime por desmantelar. Mas esse não é só dever do Estado, mas de todos os portugueses. Nem Governo nem oposição se mostraram interessados em tornar urgente o que, há quatro meses, toda a gente viu que era urgente. Porém, também não notei, depois dos primeiros actos solidários com Pedrogão-Grande, movimentos da sociedade civil insistirem na necessidade de estudar, planear, e agir.
Nada do que escrevo invalida a responsabilidade formal, directa, imediata, de quem governa, e de quem se desgoverna na coordenação de meios, na definição de estratégias, e no trabalho no terreno. Se o final deste processo for justo, há um generoso número de figuras que devem ser pura e simplesmente removidas do caminho. Mas tal “limpeza”, por si, não resolve o essencial – que é a mudança de atitude que tem de atravessar toda a sociedade portuguesa, do mais humilde pastor ao presumido governante.
Das coisas boas do advento das redes sociais é esta “gritaria” que se “ouve”, e na verdade se lê, sempre que há um caso polémico que mexe connosco, seja por razões políticas, sociais, emocionais, de justiça. Há um sentimento de liberdade – muitas vezes lamentavelmente confundido com impunidade e “vale tudo”... – que me parece de tal forma saudável e democrático que suplanta o lado negro das redes, que é essa grotesca, ordinária, reles, tantas vezes criminosa forma como muita gente aproveita a janela de liberdade como saída de esgoto de frustrações, ódios, casos mal resolvidos, etc..
Dito isto, seria sobre o “caso Sócrates” que deveria vir aqui deixar o meu “acrescento”. A “gritaria” está ao rubro. Sucede que, nestas ocasiões, me vejo ofuscado por tudo quando se diz, e sinto sempre que não tenho nada a acrescentar.
É o que está a acontecer. Acho que já foi tudo dito – pelo menos, o que diria se me desse para aí. Para trás, no arquivo deste blog, está mais de uma dezena de textos que deixam clara a minha opinião sobe a figura, e até alguns momentos em que nos cruzámos.
Agora, passada a excitação inicial, o que gostava era que, num clima de excepcional profissionalismo (ouvi alguns especialistas em quem confio dizerem que aquelas 4000 páginas são não apenas sólidas como inteligentemente produzidas), daqui se passasse a um julgamento que não chegasse ao fim quando talvez já nem me lembre de quem era esse tal de Sócrates. Isso é que era bonito.
O filme é de 2001, mas se a memória não me falha estreou em Portugal em 2002. Foi o último que vi no mítico cinema Quarteto, a sala (vezes 4) de Pedro Bandeira Freire, na Avenida Estados Unidos da América, antes de fechar e assim ficar até aos dias de hoje. Apesar de ser algo a meio caminho entre a comédia e o drama, e tão simples no guião como na forma como se desenrola, mexeu comigo muito mais do que esperaria. Comovi-me, ri, chorei, e andei com ele na cabeça meses a fio. De tal maneira que o procurei em DVD vários anos – e quando encontrei, algures num site espanhol, comprei logo. Mais tarde chegaria a Portugal.
Chama-se “El Hijo de la Novia” (em português, literalmente, “O Filho da Noiva”), e tanto quanto sei foi a obra que revelou ao “mundo” os argentinos Ricardo Darín (protagonista), e o realizador Juan José Campanella. A "fita" (como gostava de dizer Fonseca e Costa...) esteve nomeada para o Oscar de melhor filme estrangeiro desse ano. Não ganhou, mas em 2010 Campanella “vingou-se” com “O Segredo dos Seus Olhos”.
Quando se fala de filmes que marcam as nossas vidas, costumo citar este (entre outros, claro), por estar fora do enquadramento mais óbvio. Não é uma obra-prima, não mudou a face da terra, não foi a génese de novas formas de fazer cinema. Foi apenas um filme argentino inesperado, para mais de orçamento modesto, cuja história, de tão bem contada e melhor interpretada, mexeu comigo e com as preocupações, os sentimentos, e tudo o que me interessa nas relações humanas.
Como disse, deu-me uma trabalheira encontrar o DVD, na altura sem legendas. Mais tarde, lá saiu uma edição portuguesa. E depois o filme entrou no natural esquecimento desta selva, onde tudo se atropela e só fica quem grita mais alto.
Há dias, por acaso, descobri esta coisa fantástica: o filme está disponível na net, de borla, sem pirataria nem malandrice, na íntegra e com razoável qualidade. Aqui. Voltei a vê-lo, claro. E não deixei de notar como, em 20 anos, tudo mudou a um ponto em que é possível ter à mão o que, naquele distante 2002, me custou encontrar e mais ainda pagar. Como será daqui a 20 anos?
Em todos os actos eleitorais assistimos ao mesmo relambório: exceptuando o segundo classificado – quase sempre o PS ou o PSD -, que reconhece a derrota e vai para casa, todos os outros discursam para as televisões a cantar vitória. Ou tiveram mais votos, ou mais juntas de freguesia, ou ultrapassaram o adversário mais próximo. Ou, pura e simplesmente, tiveram votos, coisa extraordinária.
O campeão das vitórias, desde que me lembro de assistir a estes finais de noite, é o PCP, que ganha sempre qualquer coisa, nem que seja o facto de nada ter perdido.
E foi por aí, pelo facto de ter visto, há oito dias, Jerónimo de Sousa, reconhecer uma derrota eleitoral, que decidi escrever a minha mais recente crónica na plataforma Sapo24. Entre a ironia e a pura opinião de eleitor. Está aqui, caso tenham curiosidade.
O que não esperava, ou já não me lembrava, é o que pode constituir uma caixa de comentários para efeitos de desabafo, psicoterapia, ou simples destilar de bílis. Quando dei por eles, eram já uns tantos, insultando-me de tudo, classificando-me tanto de militante do PSD quanto do CDS, usando a mais fina linguagem para reduzir o texto a uma ideia: o Rolo é um atrasado mental. Como ando nisto há mais de 30 anos, e até a ameaças físicas tive direito, não me incomodaram minimamente as alarvidades que se escreveram, nem me dei ao trabalho de responder. Fiquei apenas estupefacto com a importância que se dá, no mundo virtual, a um texto mais entre milhares de textos e opiniões que a toda a hora se “postam” em todas as plataformas (nalguns casos, acusando-me de ser pago pelos impostos dos portugueses, coisa que certamente dava jeito ao Sapo, porém não é verdade...).
Sinto que sou um pequeno arbusto na enorme floresta digital, e que só com um golpe genial – de talento, sorte, ou combinando ambos – alguém vai ligar ao que escrevo. Habituei-me a viver nesta recatada humildade, onde escrever não é mais do que um velho hábito que alimento.
Ao ler aquele chorrilho de insultos, fiquei contente. Não por mim, claro (ninguém gosta de ser enxovalhado gratuitamente...), mas por ver que o Sapo24 é muito mais relevante do que se julga, e está na Primeira Liga do mundo digital. Já tinha orgulho em fazer parte daquela pequena equipa – agora, insultado e tudo, tenho mais...
Pedro Passos Coelho consegue, por fim, completar a improvável quadratura do circulo: anuncia que sai mas previne que se vai manter-se por perto, reconhece que perdeu mas no fundo acha que o fizeram perder, abandona a liderança mas não descarta o regresso. Nunca tinha visto um homem tão pouco humilde fingindo tão bem uma presumível humildade.
Os candidatos a quem deu a mão, e que escolheu, fizeram mal em seguir-lhe o estilo. Talvez agora percebam algumas derrotas de domingo passado...
Rapidamente, sobre as eleições de ontem, cujos resultados me deixaram dividido entre a alegria e a tristeza, decidi fazer um clássico “Gosto, Não Gosto”... Neste caso já com o verbo no passado:
(Este texto é dedicado a toda a equipa do Sapo24, que fez uma difícil e excepcional emissão online que ajuda a definir onde está o futuro quando se fala de jornalismo...)
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