O Niza
Tenho de José Niza uma memória tão distante quanto doce. Era um amigo muito lá de casa quando eu vivia a casa dos meus pais como se fosse um palco: quase todos os dias passavam por lá pessoas que eu só via na televisão. Era miúdo e gostava disso.
(Pormenor talvez não irrelevante: todos os amigos dos meus pais tratavam o puto que eu era por tu e na base da festinha na cabeça. Excepto o José Niza: por você, e com o respeito que um miúdo gosta que lhe tenham e ninguém alguma vez tem. Pois se ainda hoje me lembro…)
Depois conheci o talento do compositor. E muito mais tarde, o homem bom que esteve lá quando foi preciso estar. Nenhum Rolo Duarte esquecerá.
O que junta estas três fases, o que une estas três imagens, é sempre algo de suave, como se se tratasse de uma pessoa que passa sem pesar, que fica mas não ocupa. Não tenho a certeza de ter sido assim o José Niza de quem se fala – mas é deste que me lembro no dia de hoje. E é deste que me quero lembrar.
O meu pai dizia sempre “O Niza”. Quando, no meu quarto, fazia de conta que era crescido e falava com os amigos invisíveis, também dizia “O Niza”. Não me passava pela cabeça crescer – menos ainda que as pessoas morressem e não pudéssemos continuar a falar com elas. Na vida real ou naquela que reproduzia no meu quarto, inventando jornais e imitando o Paulo de Carvalho a cantar o “E Depois do Adeus”. Que era, lá está, “do Niza”.