Povo que lavas na rede...
Há dez anos não havia Facebook nem twitter, e o mundo dos blogues estava na pré-história. Não é fácil, por isso, em tão pouco tempo, interiorizar e perceber com rigor o poder que estas plataformas ganharam – da mesma forma, também é difícil distinguir o trigo do joio e aferir, em cada momento, onde está um movimento consistente e onde está uma brincadeira (felizmente incensurável).
Dito isto, acho que é melhor respeitar, estar atento, e ter em conta os movimentos sociais e políticos que andam na rede – eles são espelho e ao mesmo tempo sombra do que acontece no “mundo real”. Eles são mais do que isso, porque pertencem já ao real, mesmo quando não deixam o virtual.
Nestes últimos dias, da petição a exigir a demissão de Cavaco Silva até ao flash-mob para “auxiliar o Presidente”, houve de tudo.
Dado que, por razões profissionais, vasculho diariamente centenas de blogues, páginas de Facebook e de twitter, não deixei de sorrir com a ironia do destino: boa parte daqueles que, há um ou dois anos, menosprezavam e diminuíam as redes sociais que então se manifestavam contra Sócrates, e viam em todas as petições, em todos os movimentos populares, a mão invisível do Bloco, do PC, da direita, eu sei lá – pois bem, são esses os mesmos que agora enaltecem as petições, as reclamações, os protestos e as greves. Já se esqueceram de tudo o que disseram – e agora, virado o bico ao prego, vamos lá dar o braço ao “povo que lavas na rede”... Tal como os políticos, enchem a boca do que antes cuspiam, contam com a memória curta dos leitores, ou contra-atacam num ricochete ruidoso chamando ténias aos que viram neles as ténias originais...
Mal comparado, lá está, faz lembrar as sondagens: quando são a nosso favor, representam a voz do povo e são instrumento de trabalho. Quando são contra nós, é certo e sabido: “valem o que valem, o que conta são os votos nas urnas...”. Há coisas que não mudam. E é isso que me desanima e me faz repetir o que li ontem no mural da Inês David Bastos: Portugal cansa-me.