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Pedro Rolo Duarte

24
Fev13

Era uma vez a SMS

(Crónica originalmente publicada na revista Lux Woman. A deste mês já está aí à venda... )

 

Quando os jornais falaram do vigésimo aniversário da SMS, comecei por me lembrar do “bip”. Lembram-se? Era um aparelho (em rigor, “pager”) do tamanho de um maço de cigarros, que recebia mensagens escritas ditadas pelo emissor, para uma operadora, a partir de um telefone fixo. Coisas do género: “estou atrasado 20 minutos, desculpa”. Ditávamos por telefone a uma senhora, que por sua vez digitava e enviava para o “bip” do nosso interlocutor. Ele recebia a mensagem nesse pequeno aparelho, não podia responder, a não ser que fosse a um telefone fixo ditar mensagem de resposta. Poderia até enviar um palavrão, desde que tivesse a educação de soletrar a palavra, sem a dizer. Assim: “estou farto de esperar. Vai à éme é erre dê à”. A solícita operadora repetia as letras, sem nunca dizer a palavra, e enviava...

Parece antigo? É antigo, mas não tem mais de 20 anos. O tempo em que os primeiros telefones moveis pesavam 10 quilos.

Bom, tudo a propósito da forma como comunicávamos, da forma como hoje comunicamos. Mudou radicalmente. Do BIP à SMS, do fax ao mail, da internet fixa ao smartphone. Nada é como era, e as gerações que me rodeiam, entre os 40 e os 50 anos, foram vivendo estas mudanças ao mesmo tempo que as experimentavam. É por isso que os nossos filhos convivem com o Facebook como se fosse o mapa do metropolitano ou um menu de hambúrgueres, enquanto nós passamos jantares a discutir as virtudes, os defeitos, e os problemas que criámos com a plataforma. Eles, os mais novos, não distinguem estas vibrantes e diferentes formas de comunicar - e nós, herdeiros do fax, do telex, do telefone e mesmo da carta e do postal, e ainda dominados por manuais de etiqueta, criamos hierarquias no diálogo. Pior: tornámos ditadoras essas lógicas do que deve e não deve ser, a um ponto tal que podemos inviabilizar soluções em nome de uma estrutura que arrisco dizer ser vagamente fascista...

“No dia dos meus anos ele apenas mandou um SMS?”. Ou: “o tipo não teve coragem para me dizer olhos nos olhos, mandou um mail!”. Ou: “mandei-lhe uma mensagem no Facebook, ela respondeu-me pelo WhatsApp”... Há já um manual de boas maneiras não escrito sobre tudo isto. Mas a isso, a velha sabedoria - ridicularizada num filme português com o diálogo imperdível “Alô, Alô, Dona Rosa!” – tem a pergunta final: e por que não telefonar?

Do que a experiência me diz, falar ainda é a melhor solução: os “lol” e “:-)” e “;-)” ganham vida, as frases curtas são engrossadas com argumentos, e há momentos de discussão que iluminam o resto do cenário, que podia ter apenas luz na saudades ou no amor ou no ódio.

Saúdo os 20 anos da SMS, claro, porque facilitou a vida de todos e acrescentou diálogos rápidos e ricos à paisagem. Sem o Skype, a minha vida de pai seria uma pobreza triste e deprimida. Amo a SMS, no melhor e no pior. Gosto da rapidez e economia do WhatsApp. Mas não deixo de reconhecer que esta nova hierarquia comunicacional trouxe também equívocos, maior distancia, e uma frieza tantas vezes alheia à intenção de quem comunica.

Esta quase na hora de criar um novo manual de etiqueta na comunicação humana. Um código que nos ajude a distinguir o essencial do acessório – logo, também, a separar uma SMS de um insulto barato no Viber, uma conversa divertida no WhatsApp de um “chega para lá” via mail. São demasiadas plataformas para uma mesma ideia – comunicar. E é tempo a menos para gerir tantas manhas e manias.

Não desfazendo, vejo-me grego para interagir em tanta plataforma. Mas vou a todas – quem não vai, lá está, fica pelo caminho...

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