O político regressa sempre ao lugar da política
José Sócrates não é uma avestruz que enfia a cabeça na areia, e certamente lê o que sobre ele se diz, se escreve, se pensa, desde há dois anos até aos dias de hoje.
José Sócrates não saiu de Portugal para um país distante e desértico, sem ligação ao mundo e à actualidade. Sabe por isso, muito bem, o que a esmagadora maioria dos portugueses pensa dele e do seu desempenho político, e não ignora os (enormes) ódios e (escassos) amores que desperta.
Por maior que seja o seu ego, José Sócrates não é autista em relação ao estado em que deixou Portugal. Sabe o que fez e a herança que deixou, e não acredito que não tenha a noção das suas responsabilidades em todo o processo que nos conduziu à miséria presente.
José Sócrates deixou a liderança do PS mas não deixou o PS. Segue os passos do seu partido e sabe o estado de fragilidade da liderança que o sucedeu. Sabe onde deixou saudades, ou a falta delas.
Neste quadro, o regresso de José Sócrates a Portugal e ao “activo”, (descaradamente) dando a cara na televisão, das duas uma: ou é um acto de loucura, ou é um acto de coragem. A terceira hipótese – um acto de insanidade e cegueira puras – nem sequer a admito.
Se é um acto de loucura, bom, aos loucos tudo se desculpa.
Se é um acto de coragem, só pode ser assinado por quem não limites para a ambição – e nessa ausência, admite que somos todos lamentavelmente tolos.
Talvez se engane. Gostava de acreditar que se engana.
PS – Quanto a falar e ter um programa na televisão (pública ou privada), nada a dizer. Concordo com a citação de Voltaire que li num desses manifestos sobre o assunto: "Posso não concordar com uma só palavra sua, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-la."