O notável director
O “Público” festejou ontem o seu 18º aniversário e entregou a direcção, por um dia, ao seu colunista Pacheco Pereira.
O historiador foi corajoso quando aceitou dar o corpo ao manifesto junto da classe profissional que mais critica, e com a qual é implacável (e muita vezes injusto, para não lembrar os momentos em que confunde teoria da conspiração com acaso, convicção ou até, em situações limite, ingenuidade).
Enfim, Pacheco foi à luta.
O jornal que saiu não reflectia, infelizmente, o seu olhar: era basicamente igual ao “Público” de todos os dias. Não conseguiu? Ou percebeu que um jornal é feito por pessoas – e pessoas, que grande maçada, são apenas pessoas?...
O editorial reflecte dificuldades, objectivos cumpridos e por cumprir, mas nada sobre o terrível confronto com a realidade.
Notei, no entanto, que o “director por um dia” deixou escapar um dos defeitos que mais o arreliam nos media: a confusão entre informação e opinião, de que resulta a presunção de um facto inexistente.
Título de notícia na página 12: “Grupo de notáveis liderado por Paula Teixeira da Cruz reflecte esta noite sobre o futuro do PSD”.
Terá o jornal “Público”, sob a direcção do exigente Pacheco Pereira, capacidade para determinar quem é “notável” e quem não é? Que critérios objectivos, jornalísticos, determinam a elevação de alguém ao estatuto de “notável”?
(E agora, tentando ser como Pacheco Pereira é – humildemente, sem sombra da sua sabedoria mas, ainda assim...)
O facto de Pacheco Pereira, ele próprio, fazer parte desse grupo de reflexão, não inquina a notícia no dia em que ele é o director do jornal? Com que intenção o fez, ou com que intenção permitiu que a notícia fosse publicada? Quererá ter influenciado, ou mesmo inspirado, a participação de outros, porventura menos notáveis? Ou podemos admitir uma agenda mediática, quem sabe produzida por uma agência de comunicação, que escolheu justamente o dia de ontem para um encontro que, nestas circunstâncias, seria seguramente noticiado pelo “Público”, dado o seu “director por um dia” estar de serviço? Ao aceitar ser classificado pelo jornal que dirigia como “notável”, o que podemos presumir sobre Pacheco Pereira? Dito de outro modo: se um director de jornal permite que o órgão de informação que dirige o classifique de “notável”, não estaremos aqui no domínio claro do conflito de interesses, ou mesmo de um regresso ao passado obscuro dos tempos em que a imprensa idolatrava o poder, o poder que estava, o poder que era?
E por fim, mas talvez mais relevante e sintomático: por que raio Macário Correia é considerado um notável?
(Pronto, já fiz de Pacheco Pereira, agora vou citá-lo: “A comunicação social quer é festa e, quando acha que não a tem, clama por actores no palco”)
A verdade é só uma: quem nasceu para director, jamais será estagiário...