Um país bipolar
1. Vicente de Moura, manda-chuva dos nossos Olímpicos, anunciou há dois ou 3 dias que abandonava as suas funções, dado o insucesso da nossa missão, e o generoso número de alarvidades e inanidades proferidas por vários atletas. Hoje, com a medalha de ouro de Nelson Évora, Vicente de Moura diz que reconsidera e, se lhe pedirem com jeitinho, fica. Eu sei que aos desportistas se pede corpo e mente flexíveis – mas também faz parte ter a coluna vertebral flexível ao ponto de se enrolar sobre si própria?
2. Ao contrário do que sucede com uma selecção nacional de futebol, numa delegação olímpica o que se espera do seu desempenho não é um resultado colectivo, mas a presumível soma de resultados individuais. Nelson Évora não tem culpa de João Rodrigues, Emanuel Silva nunca viu a égua histérica, e Vanessa Fernandes nunca nadou ao lado de Daniela Inácio. Nessa medida, fará sentido julgar um colectivo e condená-lo pelas patetices de meia-duzia dos seus elementos? Ou será mais sensato criticar o Comité Olímpico, que prometeu resultados que não podia garantir, e ignorou que o mediatismo deste tipo de eventos obriga a algum investimento na formação dos atletas também para os momentos em que falam aos media?
3. Leio Pedro Sales, no blog Zero de conduta há dois dias: “A Austrália investe 33 vez mais dinheiro do que Portugal. Eles têm 35 medalhas, Portugal tem uma. Estas coisas contam. Têm a certeza que querem medalhas ou é só conversa?”. É óbvio que o dinheiro conta, mas alguém me pode dizer o valor do investimento olímpico do Zimbabué (4 medalhas até agora), da Bielorússia (13 medalhas), ou do Cazaquistão (8 medalhas)? Neste momento, a contabilidade coloca Portugal ao nível da Mongólia e da Estónia. Falamos apenas de dinheiro?
Estes Jogos Olímpicos – um pouco como os desempenhos mais recentes da Selecção Nacional de Futebol - deixam-me uma interrogação genérica, retórica, porém sentida: entre a medalha de ouro de Nelson Évora e o atleta que de manhã “é mais caminha”, não estará aqui o “esplendor de Portugal” – ou seja, a capacidade de oscilar entre o melhor e o pior num mesmo cenário, quase em sequência?
Um país bipolar? Eis o diagnóstico que fica dos sintomas que vou vendo. Distantemente, como convém em Agosto...