A lasca que atasca
Quem se der ao trabalho de navegar pelo blogues onde se discute politica, se pensa politica, e se debatem ideias, ficará no mínimo atordoado com o “estado da nação”: à falta de diferenças sérias e sustentadas que oponham a esquerda e a direita, ou de temas fracturantes que alimentem o debate com a mesma vivacidade dos tempos dos referendos, a candidata republicana norte-americana Sarah Palin tornou-se o bombo da festa e é um saco de boxe para meio-mundo. A forma como a esquerda a ataca é ridiculamente infantil, tão absurda como a da direita que a defende. Escreve-se sobre a senhora como se ela fosse conhecida desde sempre, como se cada parágrafo da imprensa norte-americana fosse definitivo e sem mácula. Qualquer boato serve para alimentar a fogueira. A desconfiança que paira permanentemente sobre a imprensa portuguesa é sumariamente substituída pela provinciana veneração às virtudes da imprensa americana. Como se o “New York Post” fosse melhor do que o “24 Horas”. Não é.
O que me espanta não é a circunstância da senhora ser como a urtiga e provocar reacção na raça – o que espanta é o facto de ser cada vez mais difícil encontrar polémica, discórdia e debate para lá da espuma dos dias. Porque, na verdade, Sarah Palin é espuma – tão espuma como em Portugal “discutir” Luís Filipe Menezes.
Dir-me-ão que existe e é candidata a vice-presidente dos Estados Unidos da América. É verdade. Mas é sempre bom lembrar que esse país já teve, entre outros cromos, um mau ex-actor de segunda ordem na Presidência. Isto para dizer que a profundidade do debate de ideias não se encontra, em geral, na Casa Branca – e ir lá buscar a bandeira que marca as diferenças é um pouco como se quiséssemos debater Portugal e o futuro que nos espera tendo Alberto João Jardim como elemento inspirador...
Sarah Palin é apenas mais uma bandeirinha no folclore das eleições norte-americanas. A “lasca do Alaska”, como lhe chamou Ana Gomes, é afinal o lugar onde a politica, por fim, e para rimar, atasca. Também rima com rasca, caso dê jeito.