O tal canal
Há 15 anos, quando se anunciava a chegada da televisão privada a Portugal, fiz uma série de entrevistas para o CMR (Correio da Manhã Rádio, que belíssima estação...) com alguns dos protagonistas do processo. O departamento de promoção do rádio decidiu aproveitar aquele conjunto de vozes e e concebeu um spot promocional do programa com “soundbytes” dessas entrevistas. Aquilo passou meses a fio na estação, de tal maneira que ainda hoje sei de cor algumas das frases que se misturavam na “promo”... Ouvia-se o Carlos Cruz dizer “a RTP será sempre a estação mais vista de Portugal, os espectadores estão muito habituados à RTP”; ouvia-se Soares Louro dizer “Três estações com publicidade é demais para o mercado português, pelo menos uma delas ficará pelo caminho...”; e ouviam-se outros especialistas que, regra geral, duvidavam do sucesso da empreitada. Excepção aberta para os nomes então ligados à TVI (a Igreja Católica...), e à SIC, o ambiente era de desconfiança em relação aos novos operadores e confiança na manutenção do status da RTP.
Os anos demonstraram que nem a RTP estava imune à dinâmica dos novos canais, nem o mercado era tão pequeno e pobre como se queria dar a entender. E, mais importante, os espectadores estavam disponíveis para mudar de agulhas e fazer novas opções.
Lembrei-me desse momento c0m o debate aberto esta semana, sobre o 5º canal generalista, no âmbito da abertura do concurso público para a licença de emissão. Também agora a maioria das vozes diz não haver espaço/mercado para mais um canal, defende-se o fim da exploração publicitária na RTP, e a TVI e a SIC não se cansam de lamentar a opção do Governo. A verdade, no entanto, é que há interessados no novo canal – se fosse um negócio ruinoso, o concurso morria sem concorrentes...
E, sejamos justos e rigorosos, em tempo algum a pluralidade e a diversidade fizeram mal à comunicação. Pelo contrário, foi essa abertura multicanal e mutiplataforma que permitiu a sustentação de Grupos de Comunicação Social com algum peso, e que abriu espaço ao desenvolvimento dos canais temáticos, mesmo que de forma ainda errática – como foi a privatização da imprensa estatizada e a liberalização do sector que abriram a porta a um sector de media verdadeiramente profissional.
Nesses tempos como agora, o mercado terá, como sempre, a ultima palavra – vai ser ele a “ensinar” aos operadores de que forma e com que meios quer ver cinco canais abertos a operar em Portugal. E a não ser que defendamos a teoria da ditadura dos seis meses, é assim que tem de ser...