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Pedro Rolo Duarte

31
Ago14

A barreira do berreiro

Uma boa e séria amiga, das antigas, das rijas, surpreendeu-me esta semana: desafiou-me para a cena pateta do banho de água gelada. Eu já andava incomodado com a excessiva mediatização do fenómeno, e tentara perceber onde raio o banho resultava em dinheiro para ajudar doenças como a esclerose lateral amiotrófica. Descobri que o banho não desemboca em notas - quem leva o banho é que posteriormente faz o seu donativo, e em muitos casos publicita o valor que deu, e em teoria inspira anónimos a fazerem o mesmo.
Tudo isto me faz uma enorme confusão. Fui educado segundo o principio do recato e da discrição quando se trata de ser solidário, de fazer donativos, de ajudar quem precisa. Já ajudei e ajudo instituições e causas, mas longe de mim fazer alarde sobre esse facto. Muito menos gravar videos absurdos com cenas ainda mais absurdas e - tragédia! - sem qualquer graça ou interesse. Se contassem uma historia que acrescentasse algo à nossa vida, se contassem uma anedota, uma receita caseira, enfim, qualquer coisa que acrescentasse um ponto à existência, era mau na mesma - mas ainda poderia perceber a tentação do exibicionismo. Mas isto? Um banho de água gelada com um balde e gritos?
Não percebo. Ou percebo: chegámos a um ponto tal de caos e saturação na comunicação e na troca de informação, que só mesmo ideias absurdas e sem sentido podem romper a barreira do berreiro generalizado.
Mas não alinho. Não me rendo. Não cedo. Ajudar e ser solidário é algo sério, convicto, e acima de tudo discreto. Exibir essa solidariedade desta forma ridícula é voltar ao tempo da esmola no meio da rua.
Um livro cujos lucros revertem para…? Um espectáculo cuja bilheteira é entregue a…? Um programa de tv com chamadas de valor acrescentado a favor de…? Claro que sim.
Banhos gelados em video na net? Por favor. Não quero exibir a  minha generosidade e consciência solidária como outros exibem prisioneiros de guerra, ou Ferraris, ou a conversa de encher a boca que faz desta sociedade um lugar cada vez mais hipócrita.
Dito à moda de quem anda nesse frenesim: um banho de água fria levo eu de cada vez que vejo mais uma pessoa que admiro e respeito a alinhar nessa patetice.

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