Lisboa, 2017
(Ontem, na plataforma Sapo24)
Quando Pedro Passos Coelho confirmou o nome de Teresa Leal Coelho para a candidatura do PSD à Presidência da Câmara Municipal de Lisboa, garantiu uma série de premissas que podiam estar a escapar aos analistas: que Fernando Medina ganhou a “passadeira vermelha” para mais um mandato; que Assunção Cristas pode sonhar com um honroso segundo lugar; e que Pedro Santana Lopes fez bem em não se chegar à frente. Seria uma guerra dura para quem já foi Presidente - e enfrentar um actual Presidente que herdou “gratuitamente” o lugar, sem votos nem notoriedade, e chega ao acto eleitoral com uma cidade de sucesso oferecida de bandeja, ainda por cima “alindada” como há muito os lisboetas reclamavam, até se pode afirmar que seria injusto para Santana.
Na verdade, Lisboa está hoje mais “arranjadinha” que nunca. Confesso que tenho alguns receios sobre a factura a pagar, e sobre quem a pagará. Porém, há uma conta que já ando a receber: os eixos centrais da cidade tornaram-se, desde que António Costa mexeu no Marquês de Pombal, nas avenidas circundantes, e a coisa seguiu para bingo com as obras de Medina, insuportáveis para os automobilistas. Nunca mais me desloquei por essas vias, contornando a coisa pelas Praças de Espanha desta vida ou mesmo pelas desgraçadas Almirantes Reis do antigamente. O Presidente da Câmara responde, e bem, com o reinado do transporte público – mas a Carris e a confusão dos números dos seus autocarros, os caóticos percursos, os desfasados horários (os fins de semana são trágicos, parece que vivemos num deserto), os permanentes atrasos, e a disfuncionalidade operacional (basta ver os gigantes autocarros que circulam em ruas mínimas, em vez dos minibuses que a empresa também possui...), são suficientes para se perceber que o edifício, uma vez mais, começou a ser construído pelo telhado.
Se passarmos ao Metro, não é preciso recuar muito no tempo para lembrar a crise dos esgotados cartões “Viva Lisboa”, ou as sardinhas em lata em que o serviço se transforma pela manhã e ao fim da tarde. Como cliente regular do Metro, posso elogiá-lo, fora das horas de ponta, pelas estações cuidadas, na evolução inteligente ao longo dos anos, na clareza da sua sinaléctica, e até nas ideias que abriga, seja um concerto inesperado ou mesmo o muito criticado patrocínio comercial das estações, que achei sempre uma ideia feliz... Já não lhe perdoo as avarias sistemáticas nas escadas rolantes de estações “impossíveis” (como a baixa/chiado), ou a limpeza duvidosa das carruagens...
Carlos Barbosa, presidente do ACP, que nunca deixa o crédito por mãos alheias e diz sempre o que pensa, escreveu na sua página de Facebook, a propósito do renovado Cais do Sodré: “Bonito está, mas os sentidos de trânsito são mais uma borrada completa! Será que na CML não há nenhum Engenheiro de Trafego que tenha coragem para ir contra a "ditadura dos arquitetos"?”
Tem razão. E construir a casa a começar no telhado passa também por aqui. Além da melhoria e efectiva racionalização dos transportes públicos ser prometida para depois das mudanças que nos impedem de circular, parece que esta reforma de Lisboa, sem dúvida necessária e de aplaudir, foi determinada mais por desenhos de computador 3-D, lindinhos e perfeitos, do que por práticas de quem diariamente tem de andar pela cidade. Até mesmo de bicicleta.
Medina ganhará – mas espero que alguém o confronte com a pergunta mais simples de todas: depois da fachada, quanto tempo vamos esperar pelo interior do edifício que é a nossa cidade de todos os dias? Sim, aquela cidade onde há viadutos provisórios com 40 anos, que de vez em quando ameaçam o pior...