Lx, 25 anos depois
A Agenda Cultural da Câmara Municipal de Lisboa festeja agora os seus 25 anos. E bem. Se há por aí muitos municípios que produzem uma agenda sem agenda, cultural sem cultura, a da CML tem sido excepção - agendando e "culturando" com o muito que ocorre na capital. Nos últimos anos, o desenho gráfico da equipa de Jorge Silva foi mesmo a cereja em cima do bolo. Gosto.
Uma vez, há muitos anos, pediram-me uma crónica para a Agenda, e eu escrevi. Nunca mais me esqueci desse texto, porque todo ele era sobre os nomes das ruas da cidade, com um único fim: desabafar que lamentava que o meu pai não tivesse o seu nome numa rua de Lisboa, a sua cidade. Tive esperança de conseguir esse meu secreto desejo. Até hoje, nada.
Por isso, quando agora a Agenda Cultural da CML fez 25 anos e solicitou a minha colaboração, hesitei. O meu pai não tem o seu nome numa rua, e merecia.
Ainda assim alinhei, e respondi ao inquérito sobre os anos 90. Perguntaram-me o que fiz de essencial nessa década, e eu respondi: autor/apresentador dos programas Canal Aberto (RTP-1) e Falatório (RTP-2), editor da revista K, criador e director do suplemento DNA do jornal Diário de Notícias. Também escrevia semanalmente na Visão.
Depois, foram estas as perguntas, foram estas as respostas…
Como caracteriza a Lisboa do início dos anos 1990, no panorama cultural?
Uma cidade em revolução, descoberta e renovação: as grandes festas do Frágil, a abertura do “Lux” e da “Bica do Sapato”, os anos de ouro da Moda Lisboa, a maturidade da geração de 80 do Bairro Alto. Ao mesmo tempo, a imprensa, a rádio a a TV em expansão, com novos projectos (quase todos muito urbanos: CMR e Rádio Energia, revista K, revista Ícon, etc), e uma clara ascensão da ideia de movimento urbano, cultura e moda em conciliação. Foram dez anos de glória, coroados pelo sucesso da Expo-98.
Qual foi o momento, ideia ou evento mais relevante da década?
Para a cidade, a Expo-98. Para mim, a abertura do “eixo” Lux-Bica do Sapato-Casa Nova-Delidelux. E se me perdoarem o excesso de personalização, o nascimento do meu filho, mesmo a meio da década, em 1995.
Quais as transformações que sentiu no ambiente cultural ao longo da década?
Senti que ao mesmo tempo que entravam em decadência ideias clássicas da cidade - cinemas como o Quarteto ou discotecas clássicas situadas na 24 de Julho ou junto ao rio, que não conseguiram superar a mudança em curso -, nasciam e cresciam alternativas que viriam a conduzir à Lisboa de hoje: cosmopolita, variada, vibrante. Para tudo isso contribuiu também uma terrível infelicidade que veio dos anos 80: o incêndio do Chiado - que tendo sido uma catástrofe, obrigou a renovar e recuperar todo o centro de Lisboa, com os felizes resultados que hoje estamos a ver.
O que ficou por cumprir, aos olhos de hoje?
Ficou por cumprir a cultura de bairro, a manutenção de espaços que podiam hoje conviver com a modernidade. Já falei do Quarteto, posso falar do cinema Londres, de alguns teatros, do Parque Mayer, da Feira Popular. E a baixa de Lisboa ainda está longe do que deveria ser, e o Chiado já é.
Qual o seu local preferido, dessa época, para sair ou estar em Lisboa?
Já respondi: Bica do Sapato, Lux, Pap’açorda, Casanostra, Casanova, Bar do Rio. Se fosse hoje, falaria da renovação da frente ribeirinha, que muito me tem convocado como lisboeta amante do Tejo.
Escolha um objeto que simbolize, para si, os anos 90 do século passado.
O telemóvel.