Nós
Por razões que talvez um dia destes se percebam, dei comigo na arrecadação cá de casa a juntar a colecção de 50 revistas que editei, entre 2009 e 2010, para os primeiros sábados do jornal “i”. Na origem, a revista mudava de nome todas as semanas – “Nós, românticos”, “Nós, invejosos”, “Nós, preguiçosos” – mas acabou por ficar carimbada com o nome “Nós”. Tudo bem.
Foram tempos muito divertidos. Pela equipa envolvida no jornal, entusiasta e nova, e pela liberdade que o Martim Avillez de Figueiredo e a sua direcção me concederam. Pediram-me uma revista temática, eu respondi com a proposta de uma colecção de revistas que definisse, a partir de um estudo ou sondagem, as características essenciais dos portugueses (com a loucura de se tratar de uma edição estruturada e recriada semana a semana, sem qualquer secção ou coluna fixa, além da capa), o designer Nick Mrozowski alinhou na maluquice, depois o Paulo Barata Corrêa desenvolveu e fez crescer o conceito, e até havia a vaga ideia de, no fim do projecto, transformar aquilo em livro. A equipa que dirigia o “i” gostou e apoiou o projecto, e senti-me confortável num jornal que tinha sido pensado para ser produzido e lido por gerações bem mais novas do que a minha.
Só o livro não nasceu. Quando chegou ao fim o contrato daquelas 50 edições (e já havia uma ideia para outras tantas, com outro conceito), a direcção do jornal demitiu-se e o dinheiro acabou. Lá me vim embora.
Agora, ao “revisitar” a colecção, e encontrar-me com autores que vão de José Luis Peixoto a Miguel Esteves Cardoso, de Nuno Miguel Guedes a Sónia Morais Santos, de Paulo Kellerman a Margarida Marinho, de João Tordo a João Gobern, percebi que aquelas 48 páginas semanais, magistralmente desenhadas, fotografadas e ilustradas, têm mais valor do que lhes atribuí. E talvez mereçam prolongamento de vida.
Inesperadamente, senti-me orgulhosamente rodeado de revistas que, em muitos casos, nem me lembrava de ter editado. Um prazer inesperado que deve tudo a quem a escreveu e desenhou – mas não deixa de me envaidecer por ter assinado por baixo. Ser editor também é isso.