Sobre jornalismo, simbolicamente...
É uma história sem qualquer importância, mas diz alguma coisa, simbolicamente, sobre o estado do jornalismo. Não mais do que isso. E conta-se assim:
No domingo, 12 de Outubro, a revista 2 do jornal Público trazia uma matéria de duas páginas, assinada pela jornalista São José Almeida, sobre o novo programa da RTP-I “Barca do Inferno”. Surpreendeu-me o titulo, “Uma barca de mulheres para quebrar o telhado de vidro da TV”, e estes dois parágrafos:
- “Barca do Inferno quebra ainda com uma outra hegemonia, a do dominio dos homens no espaço público mediático de comentário. É o primeiro programa de debate de actualidade feito apenas por mulheres”.
- “Uma solução que parece inverter em espelho o estereótipo de que o comentário político e televisivo é território masculino. E deste modo pode contribuir para quebrar o telhado de vidro que aparentemente não se vê, mas está lá, tapando o acesso ao espaço público mediático e mantendo aí as mulheres invisíveis”.
Ora, perante o facto de haver aqui um erro factual, escrevi um mail à jornalista São José Almeida onde corrijo o que, de alguma forma, justifica a matéria e até está na sua origem: “uma busca simples no google permitir-lhe-ia verificar que a mesma RTP-I (à época RTP-N), teve nos anos 2010 e 2011 (ou seja, há apenas 3 anos...) um programa de debate de actualidade só com mulheres, moderado por mim, chamado “Fala Com Elas”. Tinha um painel fixo (Isabel Stilwell, Estela Barbot e Joana Amaral Dias, entretanto substituída por Manuela Azevedo e por fim por Bárbara Coutinho), e sempre uma convidada diferente. Abordavam-se os temas da semana, da politica à economia, do desporto à cultura, nacionais e internacionais, ao longo de uma hora. Todas as semanas. Não sei se terá sido o primeiro programa de actualidade só com mulheres na televisão nem tenho a pretensão de ter louros de inovação - mas sei que a Barca do Inferno não é de todo o primeiro.
Fico triste quando o trabalho feito é esquecido e ignorado, em nome de um entusiasmo que oblitera a necessário investigação ao passado. Mas enfim, são coisas que acontecem, e achei que lhe devia dizer. Se entender que merece correcção nas páginas do jornal, fico grato. Se tal não ocorrer, também não vem daí mal ao mundo”.
E não vem mesmo. A jornalista São José Almeida não achou o meu mail merecedor de resposta pessoal nem de correcção no espaço “O Público errou”. A matéria continua online aqui. Percebe-se que ficaria esvaziada e sem sentido se porventura fosse corrigido o erro e assumida a negligência. Mas para quê? No meio do barulho das luzes, tudo passa, nada fica. Daqui a nada já nem eu me lembro disto.